sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Esperemos o Ano Novo com espírito de Natal. É tempo de introspecção. Avaliemos, qual severos auditores, nossas "ações" interiores, de vez que todos os pensamentos transformam-se, direta ou indiretamente, em atos. Façamos um balanço e tomara que consigamos ver algum superavit. Que tenhamos enriquecido nosso espírito. Esse resultado não é tão fácil, mas devemos persistir, embora nossa formação possa até atrapalhar, pois, como diz BERTRAND RUSSELL, "um dos defeitos do moderno ensino superior é desenvolver em demasia a instrução de certos ramos do saber e muito pouco o enriquecimento do espírito e do coração por uma imagem imparcial do mundo" (A conquista da Felicidade, Capítulo XV).
* Depois de a rotina do novo ano se estabelecer, voltaremos.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Morreu Sidney Bortolato Alves. Perdemos um amigo e um colega exemplar, extremamente dedicado à classe a que serviu por praticamente toda a sua vida profissional. Fê-lo sem a preocupação de estampar seu nome e de se tornar credor dos quantos que de seu trabalho, certamente, se beneficiaram. Anonimamente, foi incansável e, ao que agora se vê, colocou seu trabalho acima de seus interesses e de sua própria saúde.
Do modo como Sidney morreu certamente se pode e deve retirar mais um serviço dele aos advogados. Morreu em uma audiência. Não é caso de aqui se avaliar, especificamente, o ambiente daquela audiência, o comportamento daquele magistrado, das partes, do colega adverso, mas é de se reavivar um conceito que tem sido cada vez mais esquecido: a cordialidade.
Ir ao fórum, ao tribunal, participar de uma audiência, antes, preocupava por conta de estudar o caso, preparar as melhores razões, meditar sobre o que indagar das partes e das testemunhas. Hoje, esses pontos passaram para um segundo plano e nos preocupa a agressividade do ambiente, a falta de entendimento de que o sucesso e o trabalho de cada um dos que lá estão não diminui o do outro, pois a missão é trabalhar em prol da Justiça, cuja realização implica o cumprimento da obrigação de todos. O cliente, ou melhor, o advogado não é inimigo do juiz, nem do colega que, circunstancialmente, está do outro lado. Por isso, não pode ser tratado como tal: merece cordialidade e respeito, que só se gera com a criação de um clima de tranquilidade e credibilidade, dentro do qual a Justiça nascerá mais viçosa.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Aprovação do Projeto do CPC: desrespeito à comunidade jurídica. Soa profundamente desrespeitosa à comunidade jurídica a aprovação, do modo como seu deu, do Projeto de Código de Processo Civil. Houve quatro alterações de simples redação, sem afetar a essência do projeto, em relação ao qual a comunidade jurídica do país enviou centenas de sugestões e críticas, inclusive várias das quais no sentido de simplesmente rejeitar o projeto pela inconveniência da alteração da lei, sem se levar em conta as pesquisas que evidenciam a grande utilidade e efeitos práticos de muitos dos institutos atualmente existentes e que estão sendo extirpados ou grandemente modificados. Quer se crer que a forma de aprovação é a confissão do Senado Federal de sua incompetência para lidar com o assunto, de modo a se render a um projeto preparado por nomes de peso da processualística pátria, mas que talvez não tenham tido a exata visão das necessidades da Justiça e dos dramas vividos por quem dela depende. Espera-se que a Câmara dos Deputados, para onde segue o projeto, se debruce sobre as propostas, convocando outras entidades para se manifestar sobre o assunto, dando vazão exata ao necessário contraditório.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

COMPOSIÇÃO DO STJ. O presidente do Superior Tribunal de Justiça, Min. ARI PARGENDLER, prorrogou a permanência de três desembargadores convocados no Tribunal. Eles continuarão atuando após 1°de janeiro do próximo ano até a nomeação de novos ministros, que não se sabe quando ocorrerá. Os desembargadores convocados para ser ministros são VASCO DELLA GIUSTINA, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, FRANCISCO HAROLDO RODRIGUES DE ALBUQUERQUE, do Tribunal de Justiça do Ceará, e CELSO LUIZ LIMONGI, do Tribunal de Justiça de São Paulo. A prática que vem sendo adotada pelo STJ representa clara burla à Constituição, que impõe rigorosa observância no que tange à composição da Corte Superior. Com isso o Tribunal possui desembargadores além do terço de que cuida o inciso I, do art. 104, e, ainda nesse ponto, tem mais desembargadores estaduais do que federais. De outro lado, tem menos advogados (inciso II), pois as vagas preenchidas, de há muito, por magistrados convocados integram a metade do terço reservado à Advocacia. Caberia até questionar a validade dos julgamentos proferidos sem o respeito à composição imposta pela Constituição Federal.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Ao pé da letra. Tem sido muito comum, nesses tempos em que se busca a efetividade, a qualquer custo, das decisões judiciais, principalmente no que tange às execuções, o juiz determinar reforço de penhora ao constatar, por visão própria, não garantir a penhora realizada a satisfação do crédito. Tal contraria a literalidade do art. 685 do CPC, que admite o reforço, após a avaliação e se houver pedido do interessado. A questão é usual, tanto que o STJ, julgando recurso especial no regime do art. 543-C, firmou que “o reforço da penhora não pode ser determinado de ofício pelo juízo, visto ser imprescindível o requerimento do interessado” (Rel. Min. LUIZ FUX, julgado em 24.11.2010, REsp 1127815). É o respeito aos direitos do devedor, hoje usualmente suprimidos por conta da precedência que se confere aos interesses do credor.

domingo, 28 de novembro de 2010

Direito à saúde. O CNJ vem procedendo à contagem dos processos em andamento nos quais a pretensão do autor é a obtenção de vantagens que decorrem do fato de a Constituição Federal garantir a todos o direito à saúde. Até agora, foram contados os feitos em tramitação em 20 tribunais de nosso país, que chegou à marca de 112 mil processos. Estima-se que, considerando os 91 tribunais existentes, irá chegar-se a 500 mil demandas. Ótimo que a Constituição tenha assegurado o direito à saúde; ótimo que as pessoas estejam valendo-se do direito de demandar para buscar o reconhecimento de sua legítima pretensão; lamentável, porém, é que a Justiça não se tenha aparelhado para acolher esse contingente descomunal de demandas. É uma clara manifestação da deficiente estrutura do Judiciário, que não se preparou para fazer frente aos anseios decorrentes de novos direitos garantidos pela Constituição. Aí está só uma das tantas manifestações que sufocaram a nossa Justiça. Não se venha, então, a botar a culpa na legislação processual.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

PRESSA PERIGOSA. Imbuídos, com certeza, das melhores intenções e motivados pela predisposição em fazer célere a prestação da tutela jurisdicional, relatores de recursos em órgãos colegiados emitem decisão monocrática apreciando embargos de declaração oferecidos contra decisões do colegiado. O Superior Tribunal de Justiça já proclamou a nulidade de pronunciamento desta ordem (AgRg nos EDcl no AgRg no Ag 1091437). Para firmar a nulidade, invoca JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA o teor do art. 537, fine, do CPC, que determina que, diante dos embargos, o relator os apresente à mesa, nada, pois, decidindo (cf. Comentários, 15ª edição, n. 366, p. 684). Por até mais do que isso, a nulidade se revela, de vez que se a vontade a ser aclarada é do órgão colegiado, não se tem como supri-la apenas com o entendimento do prolatador do voto que deu conteúdo àquela decisão. Além disso, a se abrigar tal proceder, não se faz possível a interposição de futuros recursos, pois cabíveis são apenas contra decisões finais de colegiado, o que não se terá.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Direito de Empresa. Para o melhor conhecimento do Direito nada supera a leitura dos clássicos, quiçá mesmo como acontece na literatura. Daí a importância de se ler Carnelutti, Chiovenda, Liebman, Pontes de Miranda, Clóvis Bevilaqua, Waldemar Ferreira, Nelson Hungria. Não há o que os supere, em termos de densidade e correta localização dos institutos e no tracejar sua delimitação e os princípios de que decorrem. Todavia, nunca eles alcançam e trazem a solução do problema novo, a visão atual. Não há neles resposta para isso, até porque sequer se têm elementos para imaginar a possibilidade de ocorrência desses problemas, que nascem no cotidiano, muito depois de se conceber a estrutura do Direito. Quem quiser construir a resposta a questões novas, certamente poderá encontrar nos clássicos elementos para seu raciocínio, mas nada existe de pronto e resolvido. Tem-se muito para pensar e construir. Um outro modelo de livro a tanto se presta e, se bem feito, cumpre com rigor o que dele se espera. É o caso das Coletâneas, nas quais diversos autores se reúnem para abordar um tema novo. Falha-se na intenção quando seus autores pretendem repetir os clássicos, fazendo-o mal, pois não cumprem a missão para a qual foram concebidos e nem, logicamente, atingem os clássicos. Isso não se deu no recente “O Direito de Empresa nos Tribunais Brasileiros”(Ed. Quartier Latin). Cuida-se de obra coordenada pelos advogados Cesar Ciampolini Neto e Walfrido Jorge Warde Júnior, que se debruçou sobre os mais candentes problemas que afetam as empresas nos diversos campos do Direito. É obra de grande alcance e visão marcada pela atualidade e o enorme discernimento prático de seus autores*. Cuida-se desde a participação da empresa no processo eleitoral, como doadora de recursos, a sua submissão ao processo de recuperação e de dissolução parcial, passando pela responsabilidade de seus sócios, pelo seu nome, sua sujeição ao Código de Defesa do Consumidor, entre outros temas. É uma visão atual advinda de quem vive o Direito no seu dia-a-dia, na sua prática. É, pois, obra de Direito vivo, que só se faz completa, como é o caso, quando calcada no entendimento dos tribunais, o que torna o trabalho roteiro sério e seguro para a solução dos problemas. Advogados e magistrados que do projeto participaram conseguiram, sem desconsiderar a estrutura do Direito e suas concepções fundamentais, dar o caminho que se há de seguir para adequar-se à realidade presente de um ramo do Direito que sempre se faz novo, por ser essencialmente dinâmico, tal como o é a empresa.

* Os artigos são de autoria de Alexandre Linares Nolasco, Cesar Ciampolini Neto, Ênio Santarelli Zuliani, Fátima Nancy Andrighi, José Dias Tóffoli, Newton De Lucca, Renato Luiz de Macedo Mange, Rodrigo Octávio Broglia Mendes, Rodrigo R. Monteiro de Castro, Rogério Alessandre de O. Castro, Rudi Alberto Lehmann Jr., Swarai Cervone de Oliveira, Walfrido José Warde Jr., Walter Vieira Filho e Wilson Furtado Roberto.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Persistiremos na carência. Foi enviado à Assembleia Legislativa de São Paulo o orçamento para o próximo ano. No que toca ao tão necessitado Judiciário, a proposta do Tribunal de Justiça apontava para 12,3 bilhões, mas, no orçamento, se lhe contempla apenas com 5,7 bilhões, ou seja, um corte superior a 50%. Persistirá, infelizmente, a caótica situação reinante, em detrimento dos jurisdicionados e a evidenciar a pouca importância que o Executivo confere a esse Poder. Certamente não foram cortadas as verbas de publicidade, pois, certamente, o PSDB trabalhará firme na tentativa de ressuscitar José Serra, dando-lhe a Prefeitura. É hora de o Judiciário ir à fora e ser rigoroso com seu maior cliente, que abusa, em várias vertentes, sem dúvida alguma.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Há esperança para o Processo. Vejo com viva preocupação o desprezo que o processo vem tendo ultimamente. Não é reverenciado como ciência. Acaba sendo entendido como aquilo que o juiz de plantão entende que seja, tanto que se cogita até da possibilidade de o juiz modificar o rito, se julgar que, com isso, possa dar maior rapidez ao feito.
Senti, porém, um alento, ao ver que antes também assim fora, mas em 1934, no prefácio do livro Ação Rescisória, PONTES DE MIRANDA (Rio de Janeiro, Livraria Jacinto) registrava um ressurgimento do processo, dizendo:

“PRÓLOGO. O Direito processual readquire o seu antigo prestígio. Depois de séculos de descaso por parte dos cientistas do Direito, começa a interessar aos melhores espíritos, - por sua alta importância prática e de disciplina social. Na Alemanha, na Áustria e na Itália, a sua renascença é marcada por agudos reexames dos seus princípios fundamentais. Por outro lado, da Teoria geral do Direito e da própria Epistemologia jurídica, sem falarmos da Teoria geral do Direito público, em troca das suas contribuições e respostas decisivas, veem-lhe tôdas as novas correntes do pensamento jurídico.
“Relegado a bolorentas investigações livrescas, minado pela casuística mais inorgânica e desajeitada, ei-lo que exsurge com alicerces das melhores meditações e das mais fecundas sugestões da vida. Possa êste livro, feito do semanal exame de feitos rescisórios, concorrer para o reerguimento do nosso Direito processual, como estão a exigir a nossa cultura e a missão da Justiça.”
Realmente, entre 1934 e 2010, tivemos alguns excelentes momentos do processo, entendido como Ciência e assim tratado pelos melhores espíritos. Se hoje os dias não são dos melhores, devemos acreditar, tal como se programado estivesse um Neorrenascentismo, que o quanto vaticinara PONTES DE MIRANDA possa realmente voltar a acontecer não só pelo valor da Ciência do Processo, mas pela própria segurança que se dará a quem do processo necessita.

sábado, 23 de outubro de 2010

Cobrança de honorários advocatícios. Duas decisões do TJSP, da relatoria do Des. ARTUR MARQUES (AI 990.10.275203-8 e AI 990.10.278031-7), bem separaram a simples cobrança de honorários do arbitramento de honorários, deixando clara a distância de uma e outra situação. Em que pese o arbitramento também seja cobrança, ele se faz a partir da falta de prévia definição dos honorários ou de situação não contemplada no contrato. Uma e outra postulação marcam-se como demandas diversas, como se entendeu nos julgados citados, em cujas ementas se lê: “A ação de arbitramento é inteiramente diversa de uma mera ação de cobrança. Nesta, o valor do crédito perseguido já se apresenta definido pelo autor, e incumbe ao juiz verificar se há conformidade do pedido ao título que o embasa, mediante análise de provas relativas à constituição do crédito e à ausência de prova de sua modificação, quitação ou extinção. A ação de arbitramento, por outro lado, visa justamente a dar corpo a este crédito, que é incerto no momento de sua propositura.”

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Direito Processual Civil Europeu. Interessante obra, coordenada pelo Prof. JOSÉ ROGÉRIO CRUZ E TUCCI, acaba de vir à luz. Trata-se do Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo (Editora Lex). Escrita pelo coordenador e mais oito jovens e talentosos processualistas*, nela se traçam os pontos de convergência e discrepância entre os modelos processuais da Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Grécia, Holanda, Inglaterra, Itália, Portugal e Suíça e o do Brasil. Presta-se como material de fomento à pesquisa, a partir do qual se abre a possibilidade de se aprofundarem os estudos e a pesquisa acerca dos institutos processuais de maior relevo. A coordenação, muito mais do que idealizar o trabalho e abrir espaço para novos estudiosos, embora a maior parte deles já com lugar de destaque no panorama doutrinário nacional, realiza a real função de um Mestre: ensina a pesquisar, com o que o trabalho não se esgota nele próprio, mas aguça o sentido de busca daqueles efetivamente vocacionados para essa nobre missão.

* Os trabalhos foram elaborados por Fábio Peixinho Gomes Corrêa, Gláucia Mara Coelho, Guilherme José Braz de Oliveira, Heitor Vitor Mendonça Sica, José Rubens de Moraes, Lionel Zaclis, Luiz Eduardo Boaventura Pacífico e Ricardo de Barros Leonel.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Há de se definir quem está impedido primeiro. A quase contratação por Joaquim Roriz de advogado que, coincidentemente, é genro do Min. CARLOS AYRES BRITTO traz, mais uma vez, à baila a discussão do tema do impedimento. A entrada do genro como advogado criaria o impedimento para a atuação do Min. BRITTO no processo, com o que se eliminaria um voto contrário, dado ser conhecida sua posição sobre o assunto. Acho, porém, que, antes disso, o advogado deveria sentir-se (e dar-se, externando um suposto sentimento mais forte que qualquer outro) por impedido e ele recusar a causa para não levar o Ministro a dela sair. Já é tempo de se criar uma regra disciplinar no seio da Advocacia, considerando falta grave o profissional aceitar o patrocínio de causa em que esteja envolvido como julgador pessoa que diante da sua atuação seria vista como impedida para nela prosseguir. Isso valorizaria a profissão, pois se eliminaria a manobra mal intencionada para dar lugar a quem possa, efetivamente, fazer um trabalho sem qualquer comprometimento de outra ordem e sem negociar esse comprometimento, o que não é tarefa de que se possa ocupar um profissional que preze, no mínimo, os que dele estão próximos.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

E quem não tem amigo para fazer bilhetinho para o juiz?” Sincera, corajosa e reveladora a entrevista da nova Corregedora Nacional da Justiça, Min. ELIANA CALMON, no O Estado de São Paulo (30.09.10, p. A-22). Mostra bem conhecer os problemas da Justiça ao confessar ser juíza mas temer dela precisar (“Sou juíza que teme precisar da Justiça”). Mais do que isso, enfrenta o tema da corrupção e revela conhecer até uma de suas facetas que se pinta, normalmente, como inocente. Poderia ser chamada de corrupção afetiva, onde outros ingredientes entram em cena e são tão comprometedores quanto as demais formas pensáveis. Lembra, então, dos pedidos de julgamento, sem se esquecer daqueles que não têm padrinho e que, não tendo como pedir, ficam na fila, pagando, pois, a conta. Mãos à obra: conhecendo bem também as mazelas, há como trabalhar para melhorar. Disso, muito se precisa.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Não seria melhor sermos cidadãos? O STJ destacou um novo entendimento acerca do conceito de consumidor. Conferiu essa qualificação a quem faz o “consumo intermediário”, ou seja, passa a proteger com as regras do Código de Defesa do Consumidor “determinados consumidores profissionais”. Beneficia com isso caminhoneiro, costureira, freteiro, municiando-os, como diz a Min. NANCY ANDRIGHI, “de mecanismos que conferem equilíbrio e transparência às relações de consumo, notadamente em face de sua situação de vulnerabilidade frente ao fornecedor”. Conceder vantagens a quem tenha a dificuldade de provar contra quem melhor domina a técnica é ótimo, mas será que não se poderia gozar desses direitos enquanto cidadãos? Será que o cidadão, resguardado pelo Código Civil, não seria merecedor da dignidade que hoje só se pretende emprestar ao consumidor? Acho que muitos gostariam de ter direitos como cidadãos, dispensando a pecha de consumidor, que nos coloca em uma sociedade de simples consumo, lá não muito edificante.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

SANÇÃO ALÉM DA LEI. A Min. NANCY ANDRIGHI está propondo uma nova leitura para o parágrafo único do art. 538 do CPC, de modo a ser possível a majoração da multa até o percentual de 10%, em caso de reiteração de embargos protelatórios, dentro de um mesmo processo e não apenas em relação aos recursos opostos contra uma mesma decisão judicial. Reconheceu a Ministra que se cuida de ampliação da sanção legal, mas entende que o alargamento merece ser realizado, a fim de coibir o uso desenfreado do recurso integrativo, constantemente utilizado com o fito de prolongar o trâmite processual (cf. REsp 1.006.824, julgado em 02.09.2010). Não parece possível o alargamento, pois a sanção está associada a certa e determinada decisão, de vez que o recurso é tratado na lei não como algo autônomo, mas instituto que se põe em função da decisão, da qual, logicamente, não se pode afastar. Daí não se fazer possível utilizar a objetiva sanção de que se cuida para situações verificadas ao longo do processo. De qualquer modo, para tanto há regra na lei, pois ato do quilate do imaginado na decisão pode bem ser visto como ato inútil ou desnecessário à declaração do direito (art. 14, IV), resistência injustificada ao andamento do processo (art. 17, IV), provocação de incidente manifestamente infundado (art. 17, VI) e, ainda, especificamente, interposição de recurso com intuito manifestamente protelatório (art. 17, VII). É certo, porém, que, para esses casos, a sanção financeira prevista é menos sensível ao bolso do litigante desleal, de onde se sobressai a atração pelo mal maior.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Se não fizermos justiça, ao menos salvaremos as florestas. Sem dúvida entusiasma a Lei n. 12.322, sancionada pelo Presidente Lula, com a qual se modifica, apenas e tão-somente, o procedimento do agravo de instrumento contra a negativa de seguimento aos recursos especiais e extraordinários, que passa a denominar-se agravo, simplesmente. No conteúdo e pertinência do recurso, nenhuma modificação. Na forma, quase que perfeitas intervenções, pois era um absurdo o desperdício de papel com a montagem de novos autos, não raras vezes para se reproduzir, por inteiro, aquilo que já existia e que seria praticamente jogado fora. Isso acontecia quando o especial ou o extraordinário era ofertado contra decisão proferida no julgamento de agravo de instrumento contra decisão de primeiro grau. O instrumento estava completo, todavia, como se abortara o especial ou o extraordinário, reproduzia-se tudo, igualzinho e seguia-se agora em autos novos, com risco de, caso fosse esquecida alguma peça, o recurso não ser conhecido. Agora se ganha tempo: não se precisará tirar xérox, montar novos autos, numerar folhas, carimbar etc. Segue-se nos mesmos autos. Não há risco, com o esquecimento de uma peça, um xérox incompleto ou ilegível, o que seguirá para Brasília para os tribunais superiores é o que está nos autos, aliás, eles próprios, nada diferente. Elimina-se o risco do agravo mal instruído. Finalmente um alento, pena que não de mérito, mas menos árvores tombarão.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sobrevivência da separação. A Emenda Constitucional n. 66 de 13 de julho de 2010 tem sido apontada como a disposição que extinguiu, entre nós, a separação judicial, permitindo, apenas, a realização do divórcio: direto, imediato, a qualquer tempo e, ao que parece, só com a vontade de uma das partes.
Nem tanto.
A Emenda somente eliminou a dignidade constitucional das condições impostas para que fosse possível o divórcio, que eram a prévia separação judicial por mais de um ano ou a separação de fato por mais de dois. Essas exigências não mais são impostas pelo texto constitucional. A nova redação do § 6º, do art. 226, da Constituição Federal, restou prevendo que “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Quando, como, porque são problemas da legislação infraconstitucional, que só não pode proclamar que o casamento civil é indissolúvel ou retirar a possibilidade do divórcio, como existia antes da Emenda n. 9 à Constituição de 1967.
A legislação infraconstitucional não foi alterada, subsistindo, até que isso ocorra, o quanto disposto no Código Civil, inclusive no que tange à própria disciplina do divórcio. O novel preceito não se mostra incompatível com disposições que imponham condições para o divórcio ou prevejam outras medidas de menor força em relação à situação conjugal. Também por isso a mudança da Constituição não autoriza a conversão imediata das ações de separação judicial em divórcio direto, pois de uma e outra medida decorrem efeitos diversos, ensejando aos interessados optar por um ou outro caminho, conforme seus interesses, suas esperanças, suas convicções religiosas e até sua vontade de ser mais ou menos livre.
Entre o que se pretende e o que a lei permite sempre existe uma distância, de modo que se pode tachar de açodados os que interpretam a Emenda Constitucional como a mão única para a salvação dos impasses conjugais, pois a tanto o preceito, como agora posto, não leva.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

EFEITOS SUSPENSIVO A RECURSO EM EMBARGOS DO DEVEDOR. Acórdão do TJSP deu interpretação condizente com o sentido da lei à cláusula relevância da fundamentação do recurso, que permite a concessão de efeito suspensivo a recurso que não o tenha. Firmou o julgado (AI 990.10.220393-0, rel. Des. CAMPOS MELLO, julgamento em 09.06.2010) que “é necessário, portanto, análise, ainda que perfunctória, sumária, daquilo que foi alegado na apelação, para que possa ser mensurada a probabilidade do êxito do ataque desfechado contra a sentença, pena de ser postergada inutilmente a efetividade da tutela jurisdicional que o ordenamento conferiu, em princípio, à parte contrária”. Com isso, negou-se provimento a agravo de instrumento interposto contra decisão que recebeu apelação interposta contra sentença que rejeitou embargos do devedor, em execução fundada em título extrajudicial, apenas no efeito devolutivo. Lembrou-se, a robustecer esse entendimento, do maior vigor que se confere ao exequente na execução e do sentido que se empresta a essa supremacia, permitindo que a execução prossiga, até porque reafirmada a força do título executivo com a rejeição dos embargos.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Pagar ou pagar. Aplicando corretamente a regra do art. 475-J do CPC, que não dá margem a outra providência a não ser a de pagar, firmou o STJ (REsp 1.080.694, rel. Min. MASSAMI UYEDA, julgamento em 12.08.2010) que o pedido de expedição de guia de pagamento formulado pelo devedor não suspende o prazo estabelecido pelo art. 475-J do CPC. O relator justificou que não tem lugar qualquer formalidade, que não se coaduna com os princípios da celeridade e da efetividade trazidos pela reforma da lei instrumental civil ao processo de execução.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Proteção também dos mais abastados. Talvez choque os justiceiros de plantão, mas onde a lei não distingue o interprete não pode distinguir. Por força disso, quando se protege, fazendo-o impenhorável, o imóvel próprio, no qual reside o devedor (art. 1º da Lei n. 8.009/90), está se protegendo a casa, independentemente de seu valor e sua dimensão, mesmo que essa seja o único bem que integra o patrimônio do devedor. Assim corretamente entendeu o STJ, enfrentando a possibilidade de constrição de imóvel situado em bairro nobre de capital e com valor elevado. Indagou se poderia ele, diante dessa circunstância, ser considerado bem de família, desfrutando, pois, da proteção legal de impenhorabilidade. Ressaltou-se, então, que o fato de ser valioso o imóvel não retira sua condição de bem de família impenhorável (cf. REsp 715.259, rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, julgamento em 05.08.2010). Esse instituto já foi muito ampliado, ultrapassando os limites que inicialmente foram conferidos ao bem de família. Essa, contudo, assim não pode ser considerada, pois a casa é a casa, seja lá como for.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

JUIZ ROMANCISTA. ALCIR PÉCORA publicou na Ilustrada (06.08.2010, p. E5) uma valiosa crítica ao romance Xeque-Mate, escrito pelo juiz FAUSTO DE SANCTIS. Talvez para amenizar sua reprovação ao livro, antecedeu sua apreciação com elogios ao autor, porém enquanto magistrado, usando mal, em parte, o precioso espaço que se lhe deu, dado que se aguardava uma avaliação literária. O comentário do livro feito pelo professor de Teoria Literária da Unicamp me dispensa de sua compra e, mais ainda, de sua leitura. Todavia, a análise do juiz pelo literato peca pela ilegitimidade: avaliação mais correta e adequada se encontra em operadores do Direito.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

MINISTÉRIO PÚBLICO RÉU. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reafirmou a possibilidade de o Ministério Público, embora não tendo personalidade jurídica, ser réu em ação rescisória, em razão de ter figurado como autor no processo cuja decisão se busca rescindir (Ação rescisória n. 70025567140, rel. Des. FRANCISCO JOSÉ MOESCH, julgamento em 18.11.2009). Reconheceu-se a ele “capacidade judiciária”, que seria suficiente para tanto. Justificou-se a decisão também com a circunstância de, se ostenta ele capacidade para conduzir processos, exibe também legitimidade para responder pelas suas consequências. Nada mais correto, devendo entender-se por consequências tudo quanto possa advir de um julgamento desfavorável. Não esgotaria, desse modo, suas obrigações somente acudindo ao ônus de defender os interesses públicos apontados pela Constituição e pelas leis.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

A redução da importância do Judiciário. Foi recebida com grande alarido decisão judicial que admitiu fosse encaminhado aos cadastros dos maus pagadores (SERASA, SPC e outros) o nome de devedor de alimentos. Viu-se nisso algo como a solução definitiva para os problemas. Que tristeza! Mais um ato que renega, sem qualquer margem de dúvida, a importância do processo, vendo nele um instrumento ineficiente, perdendo importância diante da mais dinâmica operacionalidade dos cadastros dos inadimplentes. Com isso se diminui a importância do Judiciário, a quem compete dizer o direito e, mais importante do que isso para o caso, realizá-lo, se necessário com o uso da força. Soa hilário, de outro lado, que o devedor renda-se e pague a dívida não porque a Justiça lhe cobre, mas em razão de seu nome estar inserido no rol dos devedores. A Justiça deveria preocupar-se com mais esta perda de prestígio.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Ourives x Fordistas. Interessante análise veio à tona na sessão do último dia 20 da 25ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, durante o julgamento de um recurso de embargos de declaração. Reclamava o Des. SEBASTIÃO FLÁVIO do mau uso dos embargos, por meio do qual se busca, quase sempre, uma revisão da decisão, supondo-se que os julgadores não tenham efetivamente se detido nas coisas do processo. A queixa foi compartilhada pelo Des. RICARDO BELLI, lembrando da inapropriada menção à contradição. Trouxe à baila o Des. AMORIM CANTUÁRIA entrevista publicada nas Páginas Amarelas da Revista Veja pelo Min. CEZAR PELUSO, e disse existirem juízes que, qual ourives, debruçam-se sobre o ouro para criar a joia; e outros que se colocam qual operários na linha de produção, tendo a obrigação de produzir tudo quanto, do outro lado, em sua mesa entrar. Reclamou, com total razão, de se lhes cobrar produção, números, com o que o juiz pode esquecer-se de que no processo existem pessoas, de modo a melhor calhar a visão do ourives.

terça-feira, 13 de julho de 2010

É preciso coragem e sangue frio, até que a lealdade se torne regra. Dando espaço ao vício de vasculhar jurisprudência, encontrei um agravo de instrumento interposto contra duas decisões, proferidas e publicadas em dias diversos, mas próximos, a ponto de tornar possível cumprir o decêndio legal para recorrer conjuntamente. Eram duas decisões de recebimento de apelação nos efeitos devolutivo e suspensivo, contrariamente aos interesses de uma das partes, que pretendia tê-los só no efeito devolutivo, abrindo ensejo à execução provisória da sentença. Indaguei a alguns colegas sobre como recorrer e todos deixaram claro que não se deveria correr risco, de modo que melhor seriam dois recursos, cada um atacando uma das decisões. No caso, porém, foi interposto um único agravo, atacando as duas decisões, mostrando o recorrente certo sangue frio, pois fácil seria sustentar que um recurso não pode impugnar duas decisões proferidas e publicadas em datas distintas. Far-se-ia como que um princípio da unirrecorribilidade às avessas, ou seja, da mesma forma como se impõe, como regra, um único recurso para cada decisão, se justificaria também para cada decisão o seu próprio recurso. Todavia, melhor se houve o acórdão, que, conhecendo do recurso único, partiu para o mérito e resolveu-o, enfatizando que “seria um excessivo formalismo exigir que o recorrente interpusesse um agravo de instrumento para cada uma das decisões exaradas”. Lembrou, ainda, da celeridade, da economia e da ausência de nulidade se prejuízo não existir (cf. TJSP – Agravo de Instrumento n. 990.09.363645-0, rel. Des. VERA ANGRISANI, julgado em 29/06/2010). Além do acerto da decisão com a aplicação correta de indispensáveis princípios, surge com muita força a lealdade para com o advogado, o que não se vê com muita habitualidade, preferindo-se, diante da dúvida formal, optar pela forma, até porque com ela não só se pode diminuir o serviço, mas acima de tudo se chamusca a reputação do advogado, colocando-o em posição de inferioridade. O sangue frio do patrono do recorrente foi, no caso, compensado com a lealdade da julgadora, que, sem dúvida, teria argumentos para refutar o recurso, embora negasse com isso também princípios mais importantes que a reles forma pelo simples gosto da forma.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Direito de retirar-se diante da ausência do juiz. O Estatuto da Advocacia assegura ao advogado o direito de “retirar-se do recinto onde se encontre aguardando pregão para ato judicial, após trinta minutos do horário designado e ao qual ainda não tenha comparecido a autoridade que deva presidir a ele” (art. 7º, inciso XX). O STJ distinguiu a simples ausência da presença do juiz no fórum, mas realizando outra audiência, hipótese em que não seria legítimo o abandono do local pelo advogado (HC 97.645-PE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/6/2010). A distinção amplia o preceito e com isso reduz o direito do advogado. Até pode justificar, futuramente, discussão sobre a ausência motivada ou não, o que não seria intenção do legislador, dado que a ausência de que trata a norma é aquela que se dá no exato local onde o ato há de ser realizado.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Intervenção de terceiros no Anteprojeto. A sistemática da intervenção de terceiros no Anteprojeto do CPC tem, na aparência, grandes modificações. Restringe-se a três institutos: desaparecem, em princípio, a oposição, a denunciação da lide e a nomeação à autoria; acrescenta-se o amicus curiae. Nada bom e nada bem estruturado.
Amicus curiae nada tem com intervenção de terceiros, de vez que se coloca como alguém (pessoa física, órgão ou entidade especializada) que é chamado a manifestar-se, sem ter interesse na solução da contenda e no conflito que nela se coloca. É um conselheiro, digamos assim. Seria algo como um testemunho qualificado pela especialidade, sem se sujeitar, evidentemente, aos efeitos da decisão. Melhor seria fosse colocado, por exemplo, entre os auxiliares da justiça.
O que hoje é denunciação também não desaparece, mudando só de nome, dado que vem inserido na seção do chamamento, tratado como “chamamento em garantia” (art. 330) e com disciplina bastante precária, sem sequer resolver as questões controvertidas que, atualmente, em torno do instituto, se colocam. Da mesma forma, sem se caracterizar com instituto próprio e sem ter uma disciplina que bem o demarque, não é diferente, em termos de conteúdo, o que está no art. 339 da nomeação à autoria de agora, dado que se permite, em alegando o réu ser parte ilegítima, que o autor emende a inicial para corrigir o vício.
De concreto foi excluída a oposição, instituto tradicional e que já permitiu seguras e rápidas soluções, sendo efetivo exemplo de economia processual.
A mudança conseguirá, se for esse o objetivo, trazer novos e complicados problemas formais, protelando o desfecho do processo. Certamente, porém, não é isso que dela se pretende.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

ANTEPROJETO DE CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Reconhecendo o malogro de tantas e tantas leis que reformaram, ou melhor, mutilaram o CPC, advém o Anteprojeto, elaborado por uma comissão de juristas, capitaneada pelo Min. LUIZ FUX. Não é proposta de entusiasmar. Longe disso. Mantém, por exemplo, o vezo de doutrinar, o que não é tarefa própria da lei. Nesse sentido, depois de manter a salutar imposição de que todos os atos decisórios sejam fundamentados e dizer o que faz a sentença, preocupa-se o Anteprojeto com sua fundamentação e pretende ensinar como essa deve ser. Proclama, então, esta autêntica pérola: “fundamentando-se a sentença em regras que contiverem conceitos juridicamente indeterminados, cláusulas gerais ou princípios jurídicos, o juiz deve expor, analiticamente, o sentido em que as normas foram compreendidas, demonstrando as razões pelas quais, ponderando os valores em questão e à luz das peculiaridades do caso concreto, não aplicou princípios colidentes” (parágrafo único, do art. 472). Isso é teoria. O juiz não precisa dessa lição. A doutrina já supre e com vantagens o que há de se entender por fundamentação e quando ela se faz suficiente.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

COISA JULGADA QUANTO À TAXA DE JUROS. O aumento da taxa de juros estabelecida pelo atual Código Civil em relação ao anterior fez reabrir questão que, no passado, já se feriu em relação à correção monetária. Àquele tempo, discutia-se se uma decisão, que houvesse expressamente negado a correção monetária, poderia ser alterada, posteriormente, diante do advento de lei prevendo que a correção deveria incidir em todas as cobranças judiciais. Agora, a questão se põe frente a decisões que, ao invés de proclamar que os juros impostos na condenação eram à taxa legal, fixaram-no, expressamente, em 6%, que nada mais era que a taxa legal. O STJ deteve-se na questão ao julgar sua Corte Especial recurso repetitivo (REsp 1.111.117, julgamento em 02.06.2010) e, por maioria de votos (vencido o Min. LUÍS FELIPE SALOMÃO, ficando com o acórdão o Min. MAURO CAMPBELL MARQUES), firmou o entendimento de que a adoção da nova taxa, apesar da decisão expressa anterior, não fere a coisa julgada. Lembrou a decisão que o dispositivo sob o qual a decisão foi emanada desapareceu com o advento do Código de 2002, quando a matéria veio a ser disciplinada pelo art. 406. Destacou-se que os juros são consectários legais da obrigação principal, razão pela qual devem ser regulados pela lei vigente à época de sua incidência. Em sendo assim, torna-se evidente que o juiz, na formação do título judicial, deve especificá-los, conforme a legislação vigente. Em vista disso, a norma superveniente o afeta, impondo que a ela se ajuste. Assinalou-se, outrossim, que a pretensão de recebimento de juros moratórios renova-se mês a mês, tendo em vista tratar-se de efeitos futuros continuados de ato pretérito, sendo corolário do princípio da aplicação geral e imediata das leis (art. 6º da LICC). Os juros de mora representam uma remuneração devida em razão do atraso no cumprimento de uma obrigação, tendo o credor o direito de receber o valor exato da mora. Concluiu, pois, que não caracteriza violação da coisa julgada, em execução de sentença, a cobrança de 12%, apesar de a sentença haver determinado, especificamente, o percentual de 6% ao ano.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Representatividade adequada. O real reconhecimento da dimensão dos conflitos tem feito crescerem as ações coletivas, que se externam não somente naquelas demandas voltadas, já no nascedouro, à defesa dos interesses difusos e coletivos, mas também em relação a pleitos aparentemente individuais, mas cujo resultado transpõe os limites do interesse dos demandantes, afetando terceiros. Daí a indispensável aferição da aptidão e seriedade de quem acaba, originariamente ou por consequência, sendo o representante dos que não estão no processo.
A figura não tem previsão legal entre nós, mas não deixa de ser pertinente como princípio, até porque é viável de ser discutida para reconhecer a vinculação ou não de terceiros ao resultado da demanda. Há um universo enorme a ser explorado, que impõe se transite desde a admissibilidade da ação com uma representação não-eficiente até a possibilidade de se questionar, mesmo em tese sendo afetado pela decisão, a má condução do processo, que restauraria plenamente a legitimidade do suposto representado, prescindindo de rescisória.
Enfrentou esse complexo e difícil instituto FLÁVIA HELLMEISTER CLITO FORNACIARI, ao ser aprovada no doutorado da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, com a tese “Representatividade adequada nos processos coletivos”, sob a orientação da Profa. ADA PELLEGRINI GRINOVER, e perante banca composta pelos professores SUSANA HENRIQUE DA COSTA, CARLOS ALBERTO SALLES, CAMILO ZUFELATO e JOSÉ MARCELO MENEZES VIGLIAR. O fato de todos os examinadores estarem fortemente ligados ao estudo do processo coletivo deu à arguição grande interesse, lamentando-se que não se preserve de algum modo o debate em torno das teses, o que poderia representar um arquivo de qualidade impar, muitas vezes superior ao trabalho em si, até porque raras vezes se tem a possibilidade – e não só evidentemente nesse tema – de reunião de um grupo seleto para, ao mesmo tempo e a partir de um mesmo texto, explanar suas ideias e divergências. A mim dupla satisfação: por ver a filha caminhar firme e com pernas próprias em caminho tão árido e por ter lido, assistido e, portanto, aprendido um pouco de direito coletivo, superando minha quiçá defeituosa formação, marcada pela concepção do processo como um relés litígio entre indivíduos, cada qual com seu mero interesse.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Fome de impostos. Inegável a faina das municipalidades no recolhimento de tributos. Valor das transações é afastado para que prevaleça o valor venal. Esse, ao menos em São Paulo, cede lugar a um valor de referência, que seria um segundo valor venal, maior que o primeiro, não se conseguindo entender por qual razão sobrevivem os dois e por que existe o primeiro, se o segundo é o que vale. O enfrentamento disso quase sempre é desconsiderando pela necessidade de se concluir a transação, admitindo-se, então, pagar algo a mais. Interessante, porém, a decisão do STJ, pondo no lugar a exigência de valor venal diante de arrematação em hasta pública por valor inferior ao venal. Firmou-se, no julgamento do REsp 1.188.655 (rel. Min. LUIZ FUX, julgado em 20.5.2010), que a base de cálculo do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITBI), em arrematação judicial, é o valor alcançado na hasta pública. Desprezou-se a aplicação do CTN, tendo em vista que a arrematação representa a aquisição do bem alienado judicialmente, para a qual se deve considerar como valor venal do imóvel aquele atingido em hasta pública, que pode ser inferior ao da avaliação.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

LONGOS ARRAZOADOS. A era do computador e as facilidades que possibilita são, sem dúvida, os responsáveis pelos longos arrazoados forenses, próprios não só dos advogados, mas também dos magistrados. O advogado perde-se em esmiuçar fatos irrelevantes e trazer supostos precedentes, quando não sobre obviedades, quase sempre não bem tendo a ver com o caso concreto. Os magistrados esbanjam suposta erudição, citando acórdãos e mais acórdãos, não raramente sob temas pacificados e para os quais bastaria externar, quando muito, uma decisão ou até explicar, em lógica elementar, porque se nega ou se dá o que se pede. Quanta inutilidade! Daí porque os juízes não leem o que se pede e os advogados fazem-no na vertical. Quiçá ambos tenham razão, pois a forma adotada atenta contra não só o bom estilo, mas também a preciosidade do tempo, abusando da paciência alheia. Melhor todos fariam se acudissem o quanto, há muito, ditou SCHOPENHAUER, tentando fazer útil o escrito, de modo a lhe render o imprescindível crédito do leitor: "deve-se evitar toda prolixidade e todo entrelaçamento de observações que não valem o esforço da leitura. É preciso ser econômico com o tempo, a dedicação e a paciência do leitor, de modo a receber dele o crédito de considerar o que foi escrito digno de uma leitura atenta e capaz de recompensar o esforço empregado nela".

sexta-feira, 21 de maio de 2010

AUXÍLIO-VOTO. A decisão do CNJ, proibindo o pagamento do chamado “auxílio-voto”, devido aos juízes de primeiro grau que foram julgar recursos no Tribunal de Justiça de São Paulo, enfrenta a questão que lhe cabe, de índole administrativa. Resta, porém, a questão jurisdicional: há de se encarar a validade desses julgamentos. Muitas foram as autênticas vítimas dessas decisões e quem assistiu às sessões de julgamento pôde ver o constrangimento de um magistrado perante o outro. A maior parte deles não revelou maturidade para a tarefa e não conseguiu esconder o constrangimento de aprovar certas decisões, deixando de exercer o dever que se impõe a quem faça parte de colegiado de divergir, em nome de sua liberdade de convicção. Acrescenta-se a isso a incrível demora em se conseguir montar a sessão de julgamento para essas câmaras. De qualquer modo, o mal parece que irá ser extirpado. Ficará, contudo, outro, que merece igual repúdio. Cuida-se da prática de se transferir a outros magistrados de igual instância simplesmente a prolação da sentença. Com isso viajam os processos de um canto do Estado para outro, em uma estranha troca da mesma atividade entre iguais atrasados, de modo que cada um ganha argumento para justificar o seu atraso, dizendo que a tanto chegou, pois foi convocado para sentenciar casos de um colega que estava sobrecarregado. Vamos, assim, brincando de fazer Justiça.

sábado, 15 de maio de 2010

Inquilino bom não se gosta de perder. A 25ª Câmara de Direito Privado do TJSP repeliu o oportunismo inegável de certo locador que, diante da tentativa da locatária, empresa de porte e inegavelmente solvente, de devolver imóvel locado, fazia-se de desentendido e não o recebia, preferindo manter a locação e com isso aumentar seu crédito. Nessa linha, ao invés de acudir a rescisão contratual, o locador intentou ação de despejo por falta de pagamento, mas, mesmo diante da manifestação da locatária de que não mais estava no imóvel e ainda depois da constatação de que o bem estava desocupado, não se preocupou em requerer a simples e costumeira imissão de posse, preferindo ficar no aguardo da decisão final do despejo para, posteriormente, executá-lo, notadamente recebendo o valor dos aluguéis. O acórdão (apelação n. 992.09.084862-3, rel. Des. SEBASTIÃO FLÁVIO, julgado em 30.03.2010), embora reconhecesse não ter sido suficientemente diligente a locatária, no sentido de deixar clara a rescisão, limitou o pagamento dos aluguéis ao momento em que foi oferecida a contestação, no qual, inegavelmente, deixou-se extreme de dúvidas a disposição de não litigar sobre o assunto, o que não justificaria viesse o locador a estender a lide, tal como vinha fazendo.

domingo, 9 de maio de 2010

Reforma Processual Civil. Não existe, ainda, um anteprojeto do novo CPC. Há ideias e princípios que, segundo o Min. LUIZ FUX, em palestra no Tribunal de Justiça de São Paulo, serão observados e juntamente com grande número de sugestões representarão o novo Código. Foi feita a promessa, a partir da cobrança do Prof. e Des. WALTER PIVA, de que, após o anteprojeto, persistirão os segmentos jurídicos sendo ouvidos acerca do que se propõe a ser lei. Algumas modificações certas: a redução dos recursos, notadamente a restrição ao agravo de instrumento; o aumento do poder do magistrado; o agravamento das sanções processuais. Se esse filme já vimos, certamente ainda não vimos o que poderá acontecer com a maior criminalização do processo civil, ampliando-se a possibilidade de caracterizar-se o descumprimento de decisão judicial como prática de crime contra a administração da justiça. Lamentável, de outra sorte, que nada se fará para obrigar a maior cliente da Justiça, qual seja, a Fazenda Pública, a cumprir as decisões judiciais e, portanto, pagar, pontualmente, suas dívidas. Assim, com toda certeza, o Judiciário persistirá atolado.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Ordem na casa e isenção absoluta. Decisão do STJ (REsp 1.165.623, rel. Vasco Della Giustina, julgado em 14/4/2010) reconheceu a suspeição de magistrado para processar e julgar causa igual a que ele possui contra uma operadora de telefonia. Indiscutível sua suspeição, pois inegável o seu interesse na confirmação da tese com base na qual ele próprio postula. Muitas decisões, anteriormente, já negaram essa realidade, por força da demanda não ter traços personalíssimos que se verifica em outra sorte de processo, que não nesses flagrantemente repetitivos. Melhor, ainda, aplicou o STJ a regra do § 1º, do art. 555, do CPC, traçando todo o panorama futuro para situações como a decidida, evitando assim divergências que gerariam outros recursos, em desprestígio da atividade jurisdicional. Assim, destacou que a suspeição foi oferecida contra juiz que já julgou vários outros casos e, ainda, que podem existir outros magistrados na mesma situação. Conferiu, então, caráter ultra partes para o decidido, afastando qualquer ideia de anulação dos processos já julgados, pois os atos devem ser preservados, até porque praticados antes da declaração de suspeição. Firmou, então, que a tese vale somente para o futuro (ex nunc).

terça-feira, 27 de abril de 2010

Dano moral: tempero para tudo, mas que, aos poucos, vai sendo devidamente dosado. O TJMG, julgando ação indenizatória por danos a veículo decorrentes de rompimento de tubulação de água, concedeu indenização ao proprietário do automóvel por dano material, decorrentes das avarias causadas em razão do fato, mas negou dano moral, que pretendia o autor receber por força de, tendo ficado privado do veículo durante o tempo do conserto, ter se servido de transporte público, o que, no sentir do Tribunal, não se caracteriza como dano moral (4ª Câmara Civil, rel. Des. José Francisco Bueno, publicação em 18.06.2009, apelação n. 1.0024.07.787513-6/001). Aos poucos, vai sendo depurado o conceito de dano moral, que não pode ser visto em simplesmente tudo. Usar transporte público longe está de poder ser visto como uma anomalia indenizável por si só.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Ainda a multa do 475-J. Persiste a busca da definição do termo inicial para o pagamento da condenação sem a incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC. Na última tentativa (07.04.2010, REsp 940.274), a Corte Especial do STJ entendeu, por maioria (ficaram vencidos os Mins. ARI PARGENDLER e HUMBERTO GOMES DE BARROS), que a necessária intimação deve ser feita na pessoa do advogado, após o trânsito em julgado, baixa dos autos ao juízo de origem e a aposição do “cumpra-se”; só após se iniciando o prazo de quinze dias para a imposição da multa, em caso de não-pagamento espontâneo. Parece ser este o sentido correto da previsão legal. Assim escrevemos na Revista do Advogado, 88/44 e segs., mas, mesmo com essa decisão, não se pode ver a questão como pacificada, pois forte corrente continua sustentando que a quinzena começa com o trânsito em julgado. Aguardemos, pois.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Desconsideração da personalidade jurídica. A súmula n. 430 do STJ ajuda a dar melhor entendimento aos casos de responsabilização de sócios por dívidas da sociedade e também às hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica. Segundo o verbete agora aprovado, “o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”. Assim realmente deve ser, não só relativamente a débitos tributários, mas também a toda sorte de dívidas, sob pena de se subverter, por completo, o sentido de sociedade, cuja regra básica é a distinção de seus bens, em relação àqueles dos sócios. A insolvência da pessoa jurídica, inclusive nos casos de falência, recuperação judicial e outros mais, não pode gerar a responsabilidade dos sócios, se não houve abuso de direito, desvio de finalidade da sociedade e confusão patrimonial. Morre com a pessoa jurídica a dívida se a impossibilidade de seu cumprimento for fruto da frustração do negócio, desde que ele tenha se marcado pela honestidade.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

JUSTIÇA ESPETACULAR. Quase não se vê, na mídia, reclamos contra os "julgamentos espetaculares", com os quais se tenta dar uma satisfação, no duplo sentido de cumprir e agradar, à sociedade. Sequer mesmo se nota o reclamo de muitos dos advogados que neles atuam, pois até do espetáculo usam como ação de marketing, já que propaganda não lhes é permitida. Por isso, merece leitura o artigo do advogado EUGÊNIO BUCCI, no caderno "Aliás", do Estadão de 11.04.2010 (Por uma Justiça menos espetacular), no qual, a partir da morte de Saint-Just, na revolução francesa, chega ao caso do menino Sean Goldman e do casal Nardoni, lembrando da perniciosidade do grito, com o qual a voz do povo passa a ser a do inferno. Acrescenta-se ao quanto bem lá exposto a necessidade, que se faz premente, de análise da repercussão desses julgamentos na Justiça e no comportamento das pessoas, até porque as decisões também devem guardar função pedagógica. Começaria, nessa linha, por lembrar a frase da mãe de Isabela, que, no tédio do sábado, após findo o espetáculo da Justiça, disse, em tom frustrado, que continuava sem Isabela. Com toda certeza, a análise sem os holofotes reprovaria, por exemplo, as sentenças de Fausto de Sanctis e a faina do promotor Cembranelli, que nada mais fazem, em última análise, do que dar vazão às suas necessidades midiáticas, preenchendo seus egos e adornando seus currículos com acontecimentos e não efetiva atuação em prol do Direito.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Câmara suspeita. A 32ª Câmara de Direito Privado do TJSP, pelo Des. RUY COPPOLA, reconheceu sua suspeição para o julgamento de recurso, cujo resultado vazou, tendo sido, inclusive, publicado no site do Tribunal (Apelação 990.09.293437-6, de Ribeirão Bonito - DO-e 05.04.2010). Na verdade, após ter sido adiado o julgamento para sustentação oral, viu-se anotado, no mesmo dia, no andamento do processo, que teria sido dado provimento ao recurso do autor e considerado prejudicado o da ré, chegando tal suposta decisão a ser disponibilizada no Diário Oficial. Adveio, depois, que tal publicação deu-se por simples equívoco, o que efetivamente não resolveu a questão.
Ressaltou a Câmara Julgadora que o equívoco é brutal, de modo que, mesmo se não se adequasse a questão aos incisos do art. 135 do CPC, novo julgamento não poderia ter lugar, havendo, pois, todos os integrantes da Câmara subscrito a decisão, pedindo, então, que fosse considerada a suspeição, se adequada não fosse ao colegiado, como partindo de cada um de seus membros e fundada em motivo de foro íntimo.
Esse lamentável equívoco foi bem solucionado, pois se admitir a sustentação oral, após “desconfiar-se” ser aquele o resultado a que se chegaria, seria realizar-se uma simples cerimônia, sem que se lhe emprestasse qualquer importância, que, em razão do julgamento pretérito, efetivamente não teria. Estaria comprometida a importância da sustentação oral, em termos de exercício do direito de defesa e cumprimento do devido processo legal, transformando a todos que da sessão seguinte participassem em reles figurantes truanescos, pondo a perder o importante ato, que se acreditava poder trazer considerações que poderiam afetar o resultado do processo.
Denotou-se, pois, respeito ao processo. O vazamento do resultado final do processo inutilizaria tudo quanto pudesse ser feito no Tribunal, o que não seria justo, em razão do respeito que se há de devotar ao contraditório e à plenitude da defesa, que sairiam comprometidos se um ato processual fosse admitido simplesmente para se cumprir um ritual.
A Justiça é para mais do que isso.

terça-feira, 30 de março de 2010

Interesse em recorrer diante da concessão de tutela antecipada. Reina expressiva divergência em nossos tribunais acerca da continuidade do interesse no julgamento de recurso interposto contra decisão sobre tutela antecipada, diante da prolação da sentença. Diz-se que, com a sentença, já não está sendo considerada a situação de cognição superficial, que levara à concessão da tutela antecipada, com o que não existe possibilidade de manter o recurso interposto, pois a questão agora é outra. Todavia, muitos pensam diferentemente. Essa divergência existe até mesmo no seio do STJ e foi enfrentada no julgamento do EREsp 765.105, relatado pelo Min. HAMILTON CARVALHIDO, julgado em 17 de março último. Atacava aquele recurso decisão proferida no julgamento do especial que considerou que a sentença de mérito superveniente não prejudica o julgamento de agravo de instrumento interposto contra a tutela antecipada. Persistiu essa tese, no caso concreto, pois se entendeu que a superveniência da sentença de procedência do pedido não torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, pois a aludida tutela não antecipa simplesmente a sentença de mérito, mas antecipa a própria execução dessa sentença que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada. A corrente vencida, por outro lado, julgou não haver dúvida de que, processualmente, estaria prejudicado o julgamento do agravo de instrumento interposto contra a decisão deferitória da liminar, uma fez que ela esgotou inteiramente a função para a qual foi deferida no processo. Certamente as divergências persistirão e a uniformização ainda depende de maior maturação acerca do tema.

terça-feira, 23 de março de 2010

Menos sede na ida ao cofre. Os adeptos da sofreguidão na solução dos processos, que importa em transformar toda e qualquer possibilidade de execução, ainda que simplesmente provisória, em busca de dinheiro, de modo a entregá-lo ao credor e terminar o processo, sofreram duro golpe com a concessão de mandado de segurança contra ato judicial do Juiz da 13ª Vara do Trabalho de Belém. O mandado fora impetrado contra o ato de penhora em dinheiro perante o Tribunal Regional do Trabalho do Pará (8ª Região), que não o admitiu. Foi deduzido, então, recurso ordinário perante o Tribunal Superior do Trabalho (ROMS 3400-63.2009.5.08.0000). No seu julgamento, firmado ficou pelo seu relator, Min. RENATO DE LACERDA PAIVA, que “nos casos de execução provisória, fere direito líquido e certo do impetrante a determinação de penhora em dinheiro, quando nomeados outros bens. É o que dispõe o item III da Súmula n. 417/TST.” Com base nessa súmula, a Seção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho deferiu o mandado de segurança do HSBC Bank Brasil S/A – Banco Múltiplo, reconhecendo que o impetrante estava na iminência de sofrer prejuízos de difícil reparação, vindo, pois, a conceder a ordem e determinar, com fulcro no princípio da menor gravosidade para o executado, a liberação do dinheiro penhorado. Sem dúvida, uma esperança, que há de repercutir positivamente na Justiça Comum que, a pretexto de utilizar o método que originariamente começou a ser usado na Justiça do Trabalho, tem sido draconiana com os devedores, pouco se importando com outra sorte de garantia, quando acessível está o dinheiro.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Se tivesse engolido.... Com muita rapidez o brasileiro assumiu o espírito do dano moral, de modo que se tornou pleito comum o de indenização, qualquer que seja a dimensão e intensidade do dissabor experimentado. Os fatos revelam enorme criatividade. Os vasilhames de refrigerante, por exemplo, tornaram-se campo fértil para isso. São inúmeras as ações em que se busca indenização por se ter encontrado um inseto misturado ao refrigerante. Aprimorando o contraponto a essa incorrigível sede de indenização, o STJ vem de decidir que a simples compra de refrigerante com inseto estaria no âmbito dos dissabores da sociedade de consumo, não provocando abalo à honra, pois não produz humilhação ou representa sofrimento em sua dignidade (REsp 747.396, rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, julgado em 09.03.2010). O acórdão deixa, porém, um alento aos consumidores, pois parece que veria com outros olhos o caso se o conteúdo houvesse sido ingerido. Não que tenha dito expressamente que, se tivesse engolido, receberia indenização, mas ressalvou que “o dano moral não é pertinente pela simples aquisição de refrigerante com isento, sem que seu conteúdo tenha sido ingerido”, a evidenciar que a questão teria outra consideração caso o inseto engolido fosse. Julgo ser correto pensar que, a se admitir a indenização por haver engolido o inseto, o passo seguinte será a discussão do inseto em si, pois nem todos merecem igual repulsa, há de se convir.

sexta-feira, 12 de março de 2010

Alento. O Min. ANTONIO CEZAR PELUSO foi eleito Presidente do Supremo Tribunal Federal: um homem da Justiça no seu mais alto posto. Há esperanças. A seguir seu exemplo, com certeza, ter-se-á uma Justiça sem estardalhaço, mas com trabalho, dedicação e irrestrito respeito à lei e ao Direito.

sábado, 6 de março de 2010

Quem põe a mão no bolso? Um grande entrave às ações civis públicas é a prova pericial que, logicamente, impõe o direito do perito de receber seus honorários, pois não se pode exigir dele que trabalhe de graça. O Ministério Público não se dispõe a pagar e, não raramente, o juiz tenta jogar o encargo à parte contrária, que é réu e, só por isso, não deveria ter também esse desconforto. Em parte, o STJ tem posto luzes na questão, como agora no julgamento dos Embargos de Divergência no REsp 733.456, rel. Min. HUMBERTO MARTINS (julgamento em 24/02/2009), que entendeu que, na condição de autor de ação civil pública, ao Ministério Público não incumbe adiantar as despesas de honorários do perito “contudo isso não permite que o juízo obrigue a outra parte a fazê-lo”. Quem paga, então? Com certeza, não se achou, ainda, o marisco nessa briga entre o mar e o rochedo.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Sustentação oral e plenitude de defesa. A sustentação oral faz parte das medidas processuais que se prestam para assegurar o devido processo legal, a plena garantia do contraditório e da ampla defesa, em que pese, lamentavelmente, um expressivo contingente de magistrados a receba com má-vontade, não poucas vezes conclamando o orador a ser breve.
As disposições processuais asseguram, nos casos em que há direito à sustentação, o prazo de quinze minutos para a exposição das razões pelo advogado da parte. A norma processual não cuida da hipótese de litisconsortes representados por diferentes procuradores. Dela, porém, tratam os regimentos internos, fazendo-o com suposta aplicação do princípio contido no art. 191 do CPC, que prevê prazo em dobro (“e de um modo geral para falar nos autos”). Assim, o prazo passa a ser de trinta minutos divididos entre os procuradores dos diversos litisconsortes, que podem ajustar prazos diferentes entre si. Nesse sentido, dispõe, entre outros, o § 3º do art. 144 do Regimento Interno do TJSP. A regra, em princípio, transparece coerente com o sistema processual e justa, mas pode importar na inutilidade do ato, se o prazo revelar-se insignificante, com o que poderia comprometer-se a defesa.
O STJ enfrentou o assunto, embora na esfera criminal, diante de um processo do Estado do Rio de Janeiro com 44 réus, cada qual com um defensor, o que implicou, no julgamento, a concessão de menos de um minuto e meio para cada advogado. O recurso, que apontou para o cerceamento da defesa, foi acolhido, anulando-se o julgamento para que outro fosse realizado com observância do prazo de sustentação oral de 15 minutos para cada advogado (HC 150.937, Rel. Min. FELIX FISCHER, julgado em 18.02.2010).
A interpretação é de ser observada em todos os julgamentos, não apenas naqueles de natureza criminal, que guardam maior preocupação com a plenitude de defesa, e se faz de rigor até para que não se transforme essa importante manifestação do direito de defesa, visto como sagrado, em simples ritual destituído de interesse e senso prático. Para tanto, diante de cada caso, há de se buscar assegurar um prazo razoável para ensejar a manifestação de algo útil para o interesse do cliente.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Testemunho escrito. Na Itália, está em vigor, desde 4 de julho último, a Lei de Reforma do Processo Civil n. 69, com a qual foi introduzido, como regra geral, o testemunho escrito. Lá, diferente daqui, o esboço e, depois, o projeto de lei foram objeto de muita discussão em Comissões e no Legislativo, com emendas que o fizeram voltar tanto à Câmara dos Deputados, como ao Senado, como dá notícia COMOGLIO, VEDOVA, LOMBARDI e MOSCATELLI (La nuova prova testimoniale, Roma, Neldiritto Editora, 2009).
Pela nova regra, a testemunha poderá ser inquirida por escrito, apresentando resposta aos quesitos que lhe são apresentados. Para tanto, o juiz avalia essa possibilidade, considerando a natureza da causa e outras circunstâncias, bem como o acordo das partes. É certo que, examinando as respostas, o juiz sempre poderá determinar a chamada da parte para depor em sua presença.
A inovação é de ser pensada também entre nós. O testemunho ainda é visto como a prostituta das provas. Embora seja o meio mais usado para tentar demonstrar o alegado, ele acaba facilitando a atividade do juiz, que pode – e deve – dirigir o depoimento para o que lhe interessa. Todavia, mais do que isso, ele pode pinçar frases, com as quais tem condições de justificar qualquer conclusão a que chegue, difícil sendo um depoimento que não possa ser endeusado por ambos os lados. Ademais, a objetividade que se reclama da testemunha é sempre inibidora, trucando frases e melhores esclarecimentos. Além disso, o que disse nem sempre é o que consta do termo, dado ser esse resultado de ditado, que nem sempre é fiel ao declarado.
Por escrito, aumenta-se a responsabilidade da testemunha, que, de outro lado, não será cerceada quanto à resposta, podendo melhor explanar seu conhecimento e até mesmo melhor esclarecer. Se dúvida persistir, o juiz chama para depor e, para ser coerente, deverá ordenar providências, caso apure inverdades.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

“Da mihi factum dabo tibi jus”. O entendimento do STF de que a Constituição de 1988 não recepcionou a Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67) não tornou prejudicadas e definitivamente superadas as postulações formuladas com base naquela lei. Se os fatos foram expostos e se subsumiam àquela norma, nada impede que seja buscada a adequação dos mesmos ao sistema (“iura novit curia”), o que pode implicar a concessão de direitos ou aplicação de restrições semelhantes àquelas que decorriam da norma vista como incompatível com a Lei Maior. Acórdão relatado pela Min. NANCY ANDRIGHI (REsp 945.461, julg. em 15/12/2009) firmou roteiro correto para o julgamento dos recursos especiais interpostos contra decisões proferidas ou que se entendia devessem ter sido proferidas com base naquela Lei. No caso em que a Lei de Imprensa foi utilizada como fundamento do acórdão recorrido e o especial discute, justamente, a interpretação e a aplicação daquela lei, há de se procurar decidir a causa aplicando o direito à espécie. Na excepcional hipótese em que isso não seja possível, anula-se o acórdão, mesmo que não haja esse pedido, devolvendo-se o processo à origem para novo julgamento, sem a aplicação da citada lei. No caso em que a referida lei foi aplicada pelo Tribunal a quo e o especial pleiteia seu afastamento, não há, em regra, necessidade de anulação. Assim, deve dar-se provimento ao recurso com o fito de privilegiar a norma constitucional em detrimento da norma não recepcionada. Já na hipótese em que o acórdão recorrido não aplicou a Lei de Imprensa e o especial busca sua incidência, também não há motivo para anulação, pois o recurso especial não deve ser conhecido, visto que invoca aplicação de lei inválida, salvo, também, excepcionalidade a ser apurada em cada processo. Na hipótese em que o acórdão adotou tanto a Lei de Imprensa quanto outra lei válida como fundamento (tal como dispositivos da Lei Civil), se o duplo fundamento refere-se ao mesmo tema e apenas a Lei de Imprensa foi abordada no recurso, mantém-se o acórdão recorrido (súmula n. 283-STF), privilegiando-se a aplicação pelo Tribunal a quo da lei válida em detrimento da discussão da lei inválida; se o duplo fundamento refere-se ao mesmo tema e só a parcela da legislação civil foi impugnada, deve-se conhecer do especial para discutir essa parcela, descartando-se, no acórdão, o fundamento inconstitucional não impugnado; mas, se o duplo fundamento refere-se a temas diversos, cumpre apreciar a questão caso a caso e só anular o acórdão se a aplicação da Lei de Imprensa, devidamente impugnada pela parte, comprometer de maneira definitiva o julgamento.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Cercando a criatividade da fraude. Recente decisão do STJ (Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, 33/107), em medida cautelar buscando efeito suspensivo a recurso especial, examina e referenda decisão do TJSP, reconhecendo a possibilidade do uso de ação pauliana para anular transações realizadas antes da existência de dívidas, protegendo com isso credores que, ao tempo das transações, ainda não o eram. Destaca a Min. NANCY ANDRIGHI, relatora da cautelar (MC 16.170), que “embora a anterioridade do crédito seja, via de regra, pressuposto de procedência da ação pauliana, ela pode ser excepcionada quando verificada a fraude predeterminada em detrimento de credores futuros”.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Pela supressão do barbante. Vemos com euforia e – por que não? – com alguma esperança a proclamação de que o Superior Tribunal de Justiça será o primeiro tribunal do mundo inteiramente informatizado. Quero crer existissem outras prioridades para a nossa Justiça, mas se sua cúpula entendeu ser essa importante para ajudar na sua função, rendemo-nos a ela e colaboremos para que a intenção seja realidade. Curioso, porém, que, nestes tempos de Corte informatizada, subsista invencível o barbante a prender volumes de autos entre si. Existem ordens de serviço impondo tamanho dos volumes (200 folhas); há artigos na lei determinando autuação em separado de certos incidentes; mas tudo isso perde sentido quando se vê que esses volumes constituídos do número determinado de páginas ou montados para o cumprimento da lei são unidos, inseparavelmente (vá mexer nisso), por reles barbantes. Daí toda a praticidade cai por terra e o que se tem é a dificuldade do manuseio e a insuperável irritação, que duvido também não atinja magistrados e funcionários, dado não ser esse desconforto privilégio ou estigma profissional só dos advogados.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Emenda Constitucional n. 62 inconstitucional. A ANAMAGES, Associação Nacional dos Magistrados Estaduais, intentou no STF ação direta de inconstitucionalidade, na qual contesta o teor da Emenda Constitucional n. 62, que modifica, de modo radical, a forma de pagamento dos precatórios judiciais, tentando constitucionalizar um autêntico calote contra os infelizes credores do poder público. Em substanciosa peça, entre outros, aponta-se para o desrespeito ao procedimento legislativo e, no que pertine ao conteúdo da norma, para o grave comprometimento de princípios constitucionais, como o da eficácia das decisões judiciais, o da separação de poderes e até o da duração razoável do processo, que são simplesmente desprezados. A medida é alentadora não só pela possibilidade do acolhimento da ação, mas, acima disso, pela sensibilidade dos magistrados, que poderão resistir à aplicação da Emenda por conter vício de inconstitucionalidade. Quiçá poderemos proclamar que ainda há juízes no Brasil.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Novo comando. Começamos o ano com nova direção no Tribunal de Justiça de São Paulo, sem dúvida alguma, o mais importante do país, não só pelo volume de trabalho que nele se desenvolve, pelo número de magistrados que congrega, mas também pela importância que tem o entendimento do Direito em São Paulo para o resto do Brasil. Apesar de tudo isso, sabemos que nossa Justiça não anda bem: sufocada pela falta de recursos, tem feito refletir isso na lentidão dos trabalhos, no número pequeno de funcionários para atender a essa demanda e, acima de tudo, pelo desalento que abate os funcionários, com pouca ou nenhuma perspectiva de carreira. Assume a Presidência do Tribunal o Des. ANTONIO CARLOS VIANA SANTOS, excelente magistrado, conhecedor profundo do Direito, com enorme folha de serviços prestados a nossa Justiça, inclusive em entidades ligadas à magistratura. Auguramos que consiga dar ao Poder Judiciário Paulista a sua real dimensão, exigindo que seja tratado como um autêntico Poder, envergando a bandeira de sua independência, notadamente em relação ao Executivo, que, sem dúvida, da Justiça tem abusado e feito pouco.