quinta-feira, 30 de setembro de 2010

E quem não tem amigo para fazer bilhetinho para o juiz?” Sincera, corajosa e reveladora a entrevista da nova Corregedora Nacional da Justiça, Min. ELIANA CALMON, no O Estado de São Paulo (30.09.10, p. A-22). Mostra bem conhecer os problemas da Justiça ao confessar ser juíza mas temer dela precisar (“Sou juíza que teme precisar da Justiça”). Mais do que isso, enfrenta o tema da corrupção e revela conhecer até uma de suas facetas que se pinta, normalmente, como inocente. Poderia ser chamada de corrupção afetiva, onde outros ingredientes entram em cena e são tão comprometedores quanto as demais formas pensáveis. Lembra, então, dos pedidos de julgamento, sem se esquecer daqueles que não têm padrinho e que, não tendo como pedir, ficam na fila, pagando, pois, a conta. Mãos à obra: conhecendo bem também as mazelas, há como trabalhar para melhorar. Disso, muito se precisa.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Não seria melhor sermos cidadãos? O STJ destacou um novo entendimento acerca do conceito de consumidor. Conferiu essa qualificação a quem faz o “consumo intermediário”, ou seja, passa a proteger com as regras do Código de Defesa do Consumidor “determinados consumidores profissionais”. Beneficia com isso caminhoneiro, costureira, freteiro, municiando-os, como diz a Min. NANCY ANDRIGHI, “de mecanismos que conferem equilíbrio e transparência às relações de consumo, notadamente em face de sua situação de vulnerabilidade frente ao fornecedor”. Conceder vantagens a quem tenha a dificuldade de provar contra quem melhor domina a técnica é ótimo, mas será que não se poderia gozar desses direitos enquanto cidadãos? Será que o cidadão, resguardado pelo Código Civil, não seria merecedor da dignidade que hoje só se pretende emprestar ao consumidor? Acho que muitos gostariam de ter direitos como cidadãos, dispensando a pecha de consumidor, que nos coloca em uma sociedade de simples consumo, lá não muito edificante.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

SANÇÃO ALÉM DA LEI. A Min. NANCY ANDRIGHI está propondo uma nova leitura para o parágrafo único do art. 538 do CPC, de modo a ser possível a majoração da multa até o percentual de 10%, em caso de reiteração de embargos protelatórios, dentro de um mesmo processo e não apenas em relação aos recursos opostos contra uma mesma decisão judicial. Reconheceu a Ministra que se cuida de ampliação da sanção legal, mas entende que o alargamento merece ser realizado, a fim de coibir o uso desenfreado do recurso integrativo, constantemente utilizado com o fito de prolongar o trâmite processual (cf. REsp 1.006.824, julgado em 02.09.2010). Não parece possível o alargamento, pois a sanção está associada a certa e determinada decisão, de vez que o recurso é tratado na lei não como algo autônomo, mas instituto que se põe em função da decisão, da qual, logicamente, não se pode afastar. Daí não se fazer possível utilizar a objetiva sanção de que se cuida para situações verificadas ao longo do processo. De qualquer modo, para tanto há regra na lei, pois ato do quilate do imaginado na decisão pode bem ser visto como ato inútil ou desnecessário à declaração do direito (art. 14, IV), resistência injustificada ao andamento do processo (art. 17, IV), provocação de incidente manifestamente infundado (art. 17, VI) e, ainda, especificamente, interposição de recurso com intuito manifestamente protelatório (art. 17, VII). É certo, porém, que, para esses casos, a sanção financeira prevista é menos sensível ao bolso do litigante desleal, de onde se sobressai a atração pelo mal maior.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Se não fizermos justiça, ao menos salvaremos as florestas. Sem dúvida entusiasma a Lei n. 12.322, sancionada pelo Presidente Lula, com a qual se modifica, apenas e tão-somente, o procedimento do agravo de instrumento contra a negativa de seguimento aos recursos especiais e extraordinários, que passa a denominar-se agravo, simplesmente. No conteúdo e pertinência do recurso, nenhuma modificação. Na forma, quase que perfeitas intervenções, pois era um absurdo o desperdício de papel com a montagem de novos autos, não raras vezes para se reproduzir, por inteiro, aquilo que já existia e que seria praticamente jogado fora. Isso acontecia quando o especial ou o extraordinário era ofertado contra decisão proferida no julgamento de agravo de instrumento contra decisão de primeiro grau. O instrumento estava completo, todavia, como se abortara o especial ou o extraordinário, reproduzia-se tudo, igualzinho e seguia-se agora em autos novos, com risco de, caso fosse esquecida alguma peça, o recurso não ser conhecido. Agora se ganha tempo: não se precisará tirar xérox, montar novos autos, numerar folhas, carimbar etc. Segue-se nos mesmos autos. Não há risco, com o esquecimento de uma peça, um xérox incompleto ou ilegível, o que seguirá para Brasília para os tribunais superiores é o que está nos autos, aliás, eles próprios, nada diferente. Elimina-se o risco do agravo mal instruído. Finalmente um alento, pena que não de mérito, mas menos árvores tombarão.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sobrevivência da separação. A Emenda Constitucional n. 66 de 13 de julho de 2010 tem sido apontada como a disposição que extinguiu, entre nós, a separação judicial, permitindo, apenas, a realização do divórcio: direto, imediato, a qualquer tempo e, ao que parece, só com a vontade de uma das partes.
Nem tanto.
A Emenda somente eliminou a dignidade constitucional das condições impostas para que fosse possível o divórcio, que eram a prévia separação judicial por mais de um ano ou a separação de fato por mais de dois. Essas exigências não mais são impostas pelo texto constitucional. A nova redação do § 6º, do art. 226, da Constituição Federal, restou prevendo que “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Quando, como, porque são problemas da legislação infraconstitucional, que só não pode proclamar que o casamento civil é indissolúvel ou retirar a possibilidade do divórcio, como existia antes da Emenda n. 9 à Constituição de 1967.
A legislação infraconstitucional não foi alterada, subsistindo, até que isso ocorra, o quanto disposto no Código Civil, inclusive no que tange à própria disciplina do divórcio. O novel preceito não se mostra incompatível com disposições que imponham condições para o divórcio ou prevejam outras medidas de menor força em relação à situação conjugal. Também por isso a mudança da Constituição não autoriza a conversão imediata das ações de separação judicial em divórcio direto, pois de uma e outra medida decorrem efeitos diversos, ensejando aos interessados optar por um ou outro caminho, conforme seus interesses, suas esperanças, suas convicções religiosas e até sua vontade de ser mais ou menos livre.
Entre o que se pretende e o que a lei permite sempre existe uma distância, de modo que se pode tachar de açodados os que interpretam a Emenda Constitucional como a mão única para a salvação dos impasses conjugais, pois a tanto o preceito, como agora posto, não leva.