terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Desalento

Quem estava esperando uma decisão do STJ que reconhecesse representar o uso da previsão do art. 252 do Regimento Interno do TJSP uma ofensa ao contraditório e ao devido processo legal foi, certamente, tomado por profundo desalento ao ver que o STJ embarca nas mesmas águas. Seu Regimento Interno foi alterado e na letra "a", do inciso II, do art. 253 vem prevista a possibilidade de se negar provimento a agravo contra a negativa de seguimento a recurso especial "por seus próprios fundamentos". Assim, lá como cá, os fundamentos e argumentos trazidos em contraposição ao decidido podem ser desprezados, sem qualquer consideração, na medida em que a decisão atacada tenha fundamentos que pareçam bons aos olhos do relator. 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Feriados, tempestividade e prova.. .

O TJSP acolheu embargos de declaração (processo n. 0132926-87.2010.8.26.0100/50001, rel. Des. REBELLO PINHO, julgamento em 01/12/2014) modificando decisão que firmara a intempestividade do recurso por não haver se dado conta da existência de feriado que afetou, logicamente, o curso do prazo recursal. A omissão em si justifica-se, dada a simples desconsideração do feriado, mas também se admitiu a prova do feriado, o que excederia os limites do recurso, pois a omissão se marca pela desconsideração do que deveria ter sido considerado, em razão da existência de prova nos autos. Apesar desse ponto, louve-se sempre que os embargos, que são tão úteis, mas tão mal tratados pelos juízes, ajudam a distribuir mais corretamente a Justiça.

domingo, 2 de novembro de 2014

Ainda o direito de ter os argumentos considerados

Nestes tempos em que a preocupação dos tribunais é limpar pauta, não são poucos os casos em que se maltrata, gritantemente, o princípio do devido processo legal, da plenitude de defesa e do contraditório. Por isso, acho sempre fundamental que sejam destacados julgados que enfrentem mal desta ordem, repondo as coisas no seu devido lugar, o que implica prestígio para tais princípios constitucionais. Isso se estampa em julgado do STF publicado na Revista dos Tribunais 949, páginas 278 e seguintes.
Trata-se do julgamento do HC 238.918, da relatoria do Min. GILMAR MENDES, que se realizou em 18 de março de 2014. A decisão a que se chegou, no entender do advogado CÉSAR PERES, deveria ser melhor, ensejando a possibilidade de interposição de outro recurso, antes do especial oferecido, mas, de qualquer modo, o quanto consta do acórdão é suficiente para lembrar que, acima das estatísticas que cuidam só de números, deve estar o respeito aos princípios.
Chegou ao STJ, no caso, recurso especial oferecido antes da divulgação de voto vencido, favorável ao recorrente, no julgamento contra o qual o especial foi ofertado. Naquela Corte, não se reconheceu vício na publicação do acórdão, por ser “evidente” e “de fácil constatação” que o julgamento se deu por maioria. Reconheceu a Min. MARILZA MAYNARD, relatora, que a publicação do acórdão não se fez completa, mas o ônus de promover a correta integralização do julgado seria da defesa. Reputou erro grosseiro o recurso interposto, dado que deveria ter sido antecedido de embargos declaratórios a fim de procurar a complementação do acórdão, diante de cuja falta proclamou que “dormientibus non sucurrit jus”.
O voto do Min. GILMAR MENDES com isso não concordou e lembrou que o direito de defesa constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do postulado da dignidade humana. Desse modo, o homem não pode ser transformado em “objeto de processos e ações estatais”. Citando PONTES DE MIRANDA, diz “que o direito de defesa não se resume a um simples direito de manifestação no processo”. Em seguida, referindo-se a decisão da Corte Constitucional Alemã, diz que a pretensão à tutela jurídica importa no direito de manifestação, direito de informação, “mas também o direito de ver os seus argumentos contemplados pelo órgão incumbido de julgar”. Tanto corresponde, exatamente, ao que está garantido no inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal. Ademais, conclui ele, a consideração dos argumentos da parte, à luz da doutrina alemã aplicável também entre nós, exige capacidade, apreensão e isenção de ânimo, coisas que - é de se aduzir -, aqui entre nós, não são tão comuns.
Transcrever esse acórdão, não importando a solução a que chegou, é importante para que não se esqueçam aqueles que militam no contencioso que ainda têm vigor e validade aquelas cláusulas constitucionais para as quais muitas decisões dão de ombros.  

domingo, 12 de outubro de 2014

Rescisória e a literal disposição de lei

Embora se fale muito da demora dos processos e dela se queixem em maior intensidade os magistrados, até porque à demora se é levado mercê da oposição de todos os recursos possíveis e imagináveis, sobrecarregando-os, paradoxalmente o Judiciário tem dado espaço para a eternização do debate, aceitando e interpretando regras como suscetíveis de permitir uma sobrevida que pela interpretação tradicional o feito não teria. Tanto se vê não com a criação de novos recursos, que hoje são em muito menor número do que antes do Código de 1973, nem com a eliminação de entraves lançados para seu não conhecimento, mas por render-se a Justiça à possibilidade de retomar a discussão do tema, mesmo após a sagrada coisa julgada haver se formado.
A discussão trazida ao STJ sobre a súmula 343 do STF, segundo a qual “não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”, levou a este risco, que, em boa hora, não veio a se concretizar. Debateu-se (REsp 736.650, rel. Min. ANTONIO CARLOS FERREIRA, julgado em 20/08/2014) sobre a pacificação da jurisprudência, num dos sentidos da controvérsia, após a prolação da decisão rescindenda, com o que o julgado proferido anteriormente, visto com as luzes de agora, estaria ofendendo a disposição legal.
Todavia, tanto não veio a permitir o julgado, de modo que a aferição sobre a ofensa a literal disposição de lei há de ser feita segundo o panorama do tempo da prolação do acórdão. Assim, se a corrente mudar o rumo das coisas, o que era irrescindível persistirá sendo insuscetível de rescisória. 

domingo, 14 de setembro de 2014

Juros depois do depósito judicial.

Lúcido trabalho do advogado RICARDO ZAMARIOLA JÚNIOR vem estampado na Revista Dialética de Direito Processual, n. 138. Versa sobre a “a eficácia liberatória do depósito judicial na execução civil” e sua análise se faz a partir do julgamento do REsp 1.348.640, relatado pelo Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO e julgado, em 7 de maio de 2014, pela Corte Especial sob o rito das ações repetitivas. Sua análise destaca a conclusão daquele julgado, que firmou que, na fase de execução, o depósito judicial de parte ou da totalidade da dívida extingue a obrigação do devedor até o montante depositado. Lembra o autor, porém, da diferença entre os acréscimos que incidem sobre o débito segundo a legislação civil e processual e o quanto é pago de remuneração pelo banco depositário, segundo o contrato firmado entre esta instituição e o Tribunal de Justiça, ao menos o de São Paulo.

Após a análise dos precedentes, da legislação aplicável e da própria decisão em si, concluiu ZAMARIOLA, divergindo da posição da Corte Superior, que a diferença entre os acréscimos legais e aqueles (menores) pagos pelo banco depositário não pode ficar como perda do credor, em favor de quem é realizada a execução, mas deve ser suportada pelo devedor, que foi quem deu causa à execução, não pagando o que devia.

Realmente, alguém tem que pagar esta conta. Não acredito, porém, que deva ser o devedor, que nada tem com a demora do Judiciário em liberar o que depositou na intenção de livrar-se da dívida e de seus acréscimos. Melhor carrear isso ao banco depositário, que não cumpriu sua função corretamente, não preservando a coisa que lhe foi confiada. De qualquer modo, como ele assim combinou com o Tribunal de Justiça, que se volte contra este, que lhe prometeu algo que não poderia cumprir, pois não poderia suprimir nem do devedor, nem do credor, algo a que teriam direito, sem que estes tivessem também subscrito o tal contrato com a instituição financeira depositária.

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Astreintes e juros de mora

Decisão do TJSP fixou termo inicial de juros de mora diante do descumprimento de obrigação de fazer que, por sua vez, estava sujeito ao pagamento de multa diária (AI 0006815-62.2013.8.26.000, rel. Des. EDUARDO SÁ PINTO SANDEVILLE, julgamento em 13-06-2013). Implicitamente, pois, admitiu que juros são devidos nessa situação. A decisão ignorou, todavia, que, na execução de obrigação de fazer, existem duas execuções: uma para cumprimento da obrigação de fazer e outra, que existirá somente se for inexitosa a primeira ou se não for realizada em seu tempo próprio, que é a de pagamento de quantia certa.
Na primeira, não se discute dinheiro. O valor da multa é tão só instrumento de coerção indireta, voltado, pois, para compelir o devedor da obrigação de fazer a se dispor a atender o comando judicial. Dessa forma, no seu nascedouro e na etapa de cumprimento da obrigação de fazer, não está o devedor em mora com o pagamento da quantia, que se quer se sabe se será reconhecida como devida.
Em sendo reconhecido que não houve o cumprimento da obrigação de fazer ou, então, que se deu o retardo no cumprimento da obrigação, isso tudo por decisão definitiva, completa-se o título que enseja a exigibilidade da segunda obrigação, qual seja, a de pagamento de quantia certa, tendo, então, em caso de não pagamento, a incidência dos juros de mora, pois a partir daí estará o devedor inadimplente quanto ao pagamento do valor que resultou do descumprimento da obrigação. Antes disso não.
Acórdão do STJ (rel. Min. ISABEL GALLOTTI, REsp 1.239.714), bem realiza essa separação, como se verifica no trecho reproduzido no Código de Processo Civil de NEGRÃO, GOUVÊA, BONDIOLI e FONSECA (45ª edição, 2013, nota 8d ao art. 461), onde se lê: “O valor fixado provisoriamente a título de multa diária deve merecer acertamento, antes do início de sua execução, da qual será pressuposto o exercício, pelo magistrado, do juízo acerca do retardamento injustificado, de parte ou de toda a obrigação; o estabelecimento do termo inicial e final da multa e de seu valor definitivo. Apenas após este acertamento judicial, a execução da multa seguirá o rito do art. 475-J.”
Anteriormente, outro julgado do STJ já deixara assente a não incidência dos juros moratórios, abrindo diferente vertente para o caso. Assim, então, se definiu a questão: “Inincidência de juros moratórios sobre multa decorrente de sentença judicial impositiva de obrigação de fazer, por representar, ela própria, a cominação pelo retardo no adimplemento exigido.” (REsp 23.137, rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, 4ª Turma, julgado em 19/02/2002).
Realmente, se a multa é pelo retardo no cumprimento da obrigação, não poderia ter lugar uma segunda sanção pela mesma razão, ou seja, impor juros sobre o valor da sanção ainda não definida em sua finalidade.
Por uma ou outra linha de raciocínio, o termo inicial dos juros de mora sobre a multa, que foi sobre o quanto versou o acórdão do TJSP, embora implicitamente conceda aval aos juros, é um posterius que, todavia, não oculta a violação da lei processual civil (art. 461), que não contempla os juros de mora, nem admite que dos mesmos se cuide, incidindo sobre o valor da multa, antes de se ter a definição de que efetivamente existiu o inadimplemento da obrigação de fazer.

domingo, 24 de agosto de 2014

Causas repetitivas

A propósito do procedimento gizado no CPC sobre as causas repetitivas, parece-me que firmar uma orientação sobre a interpretação do direito é sempre salutar, mesmo que igual vantagem não se tenha com a vinculação do juiz ao entendimento estabelecido, pois se impede a evolução do pensamento, que é sempre útil e até necessária, notadamente porque as próprias pessoas evoluem. Todavia, a engenharia criada para se chegar à definição da tese pelos arts. 543-B e 543-C é extremamente onerosa para a atividade jurisdicional e para as partes, eliminando qualquer crédito que possa advir da definição do assunto de fundo do processo.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Educação: obrigação de ambos os pais?

Decisão monocrática do Des. VALTER ALEXANDRE MENA, do TJSP, negou a possibilidade de estender ao pai execução voltada à cobrança de mensalidades escolares, cujo contrato com a escola foi firmado unicamente pela mãe (AI 2123221-98.2014.8.26.0000, publicada em 08/08/2014). Entendeu o relator que "normas sobre dever de criação e educação dos filhos, estabelecidas para proteção deles, não substituem a necessidade de vínculo com a instituição de ensino, sem o qual não é possível responsabilizar quem nada contratou em seu nome, inclusive porque a responsabilidade solidária não se presume." Contrapunha-se a essa conclusão o caráter familiar da obrigação e também da dívida, mesmo porque a obrigação de educar decorre da Constituição e pertence a ambos os genitores, sobrepondo-se esta à formalidade da assinatura.

domingo, 20 de julho de 2014

Para quem vai a indenização?

O art. 13 da Lei n. 7.347/85, que disciplina a ação civil pública por dano a interesse difuso ou coletivo, prevê que a eventual condenação em dinheiro reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão o Ministério Público e representantes da comunidade, devendo o produto obtido ser destinado à reconstituição dos bens lesados. A colocação de intermediários entre o causador do dano, que deve indenizá-lo, e quem sofreu o dano, que deveria ser reparado, seja lá uma entidade, uma coletividade ou uma pessoa, só faz dificultar a efetiva reparação, afetando, pois, o sentido e a razão de ser da indenização. Interessante e lúcido trabalho sobre o assunto vem à luz na Revista Dialética de Direito Processual, volume 136. Nele FABIANO BURIOL, advogado no Estado do Amazonas, enfrenta os riscos do desvio e destaca a preferência da legislação no sentido de que as liquidações e execuções sejam individuais. Falta, pois, e ele assim reconhece, dar-se ciência aos lesados sobre a existência de decisão reconhecendo o direito e concedendo indenização. Sem dúvida, este é o elo que falta para que a indenização não fique apenas como uma bela página nos anais do Judiciário.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Prestação de contas - forma mercantil

Decisão do TJSP, da relatoria do Des. HENRIQUE RODRIGUERO CLAVISIO (apelação n. 0014603-96.2005.8.26.0004, de 14 de maio último), anulou decisão de primeiro grau que homologou contas ofertadas pelo autor de ação de prestação de contas, diante da insuficiência da demonstração das contas feitas pelo requerido. Não considerou o julgado o § 2o do art. 915 do CPC, que veda ao devedor das contas o direito de impugnar as apresentadas diante de sua anterior inércia. Ademais, impôs o acórdão que também o autor que impugna as contas as apresente sob a forma mercantil e devidamente documentada. A regra que retira o direito de impugnar (§ 2o do art. 915 do CPC) afeta o quanto está disposto no art. 917, que impõe ao autor e ao réu a apresentação de contas em forma mercantil. A exigência se dá quando a um e a outro se impõe a obrigação de prestar contas, não quando aquele a quem as contas foram apresentadas as impugna, pois o impugnante, via de regra, não tem os documentos comprobatórios, que ficam exatamente com quem tem a obrigação. Exigir tanto do impugnante é, pois, lhe atar as mãos, o que não é a intenção da lei logicamente. A este, portanto, basta impugnar e dizer como deve ser a conta que o devedor delas não apresentou. 

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Morando com o inimigo

Decisão do TJSP (AI 2048354-37.2014.8.26.0000, rel. Des. J. L. MÔNACO DA SILVA, por maioria de votos) negou a separação de corpos requerida por mulher, diante de desavenças conjugais que levaram ao requerimento e ao deferimento do pedido de divórcio. Entendeu o julgador que o afastamento "somente se justifica se a permanência do cônjuge puder ocasionar risco à vida ou à integridade física do outro consorte (ou dos filhos)." Negou o pedido a Câmara Julgadora, mesmo diante do decreto de divórcio, dizendo: "a despeito de ter ocorrido a ruptura do vínculo matrimonial, o que inviabiliza a saída compulsória do agravado do imóvel comum à míngua de prova do fundado receito de dano grave e de difícil reparação". Até quando será que a mulher terá que conviver com o ex-marido? Curiosa situação, mesmo porque o divórcio, mais até que a separação judicial, implica separação de corpos. A julgar pelo decidido, é possível que cada qual dos ex-cônjuges leve para sua casa seus novos namorados, pois a moradia importa em usar e fruir do bem habitado, acabando-se, pois, com os limites da família, que, mesmo desfeita pelo divórcio, subsiste em razão da existência de filhos. Sinais dos tempos?

quinta-feira, 12 de junho de 2014

RIGOR PARA ASSUSTAR A RECORRIBILIDADE

O último Boletim de decisões do STJ (Informativo n. 541, divulgado no último dia 11 de junho de 2014) revela uma preocupante postura de acabar com o mau vezo de recorrer. A vítima foi os embargos de declaração.
Assim, num julgamento, firmou-se a possibilidade de cumulação da multa do parágrafo único, do art. 538, do CPC, com a indenização pelo reconhecimento da litigância de má-fé (REsp 1.250.739, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, julgado como recurso repetitivo). Justificou-se a possibilidade da dupla punição, a partir do que não diz a lei, quando, no sentir do julgador, poderia ter dito. Elucidativo, nesse sentido, é o quanto se lê na nota sobre a decisão: observa-se, assim, que o legislador não pretendeu conferir tratamento mais benevolente ao litigante de má-fé que se utiliza do expediente do manejo de aclaratórios com intuito procrastinatório, tampouco afastou a regra processual geral, prevista no art. 18, § 2º, do CPC, que prevê indenização à parte contrária, em caso de utilização de expediente com intuito manifestamente protelatório. Nessa linha, como princípio de hermenêutica, não compete ao intérprete distinguir onde o legislador, podendo, não o fez. Desse modo, não se deve considerar a melhor interpretação a que determina que a norma especial afasta, por si só, integralmente, a norma geral, inclusive naquilo em que claramente não são incompatíveis.” Transparece o julgado fazer um alerta, prenunciando o agravamento das sanções com a duplicidade.
Por sua vez, em outro julgamento, preocupou-se o relator em arrolar procedimentos que configurariam embargos de declaração protelatórios. Além de se apontar os embargos que não buscam sanar omissão, contradição ou obscuridade do acórdão, tacharam-se de protelatórios os embargos que enfrentam acórdãos perfeitamente ajustados à orientação pacífica do Tribunal ad quem, em relação ao qual, num imposto prejulgamento da parte ou de seu advogado, não haverá nenhuma possibilidade de sucesso de eventual recurso ao Tribunal ad quem (REsp 1.410.839, Rel. Min. SIDNEI BENETI). Critica o julgado o uso dos embargos voltados ao prequestionamento de teses tranquilas na Corte Superior, indo, ademais, contra “o sistemático cancelamento da multa por invocação da Súmula 98 do STJ”, pois este procedimento “incentiva a recorribilidade abusiva e frustra o elevado propósito de desestimular a interposição de recursos manifestamente inviáveis, seja perante o Tribunal a quo, seja perante o Tribunal ad quem”.
Preocupantes, sem margem de dúvida, as duas teses, de vez que evidenciam uma tendência contra a recorribilidade, o que é por demais perigosa, notadamente quando os Tribunais Estaduais, preocupados com as metas de produção que lhe são impostas, não têm se pautado por julgamentos indicativos de escorreito exame dos feitos. Com estas e outras, a grande importância dos embargos, até no STJ, passará a ser ignorada, em detrimento dos jurisdicionados, que, infelizmente, estão sendo chamados a aprender (rectius: a conformar-se) com julgamentos de instância única. 

domingo, 8 de junho de 2014

Embargos suspensivos na execução fiscal

Proveitosa a leitura do ensaio de LEONARDO JOSÉ CORRÊA GUARDA (Revista Dialética de Direito Processual n. 135/42 e segs.), mostrando a contradição na posição do STJ a propósito do efeito suspensivo diante da interposição dos embargos do devedor na execução fiscal. Com a Lei n. 11.382/2006 desapareceu o efeito suspensivo automático, quando a execução estivesse garantida. Admitia-se, pois, embargos sem a garantia. Pela posição atual do STJ não se faz possível os embargos sem garantia, porém, mesmo com a garantia, não se lhe dá automaticamente o efeito suspensivo, colocando em risco a plenitude do direito de defesa. Pior que este entendimento prega diferentemente do quanto se põe na lei. A ele se chegou, no julgamento do REsp 1.272.827, confessadamente mercê de uma interpretação histórica, que pode ter seu valor, entretanto, não poderia ter lugar diante do texto legal.

domingo, 25 de maio de 2014

Professor Rogério Lauria Tucci

Morreu ROGÉRIO LAURIA TUCCI, estudioso do Direito que brindou o Processo Civil e Penal com trabalhos primorosos e aulas magníficas; advogado renomado, defensor de teses robustas sempre com brilho, criatividade e inteligência. Dele, além do lado humano, guardo duas lições memoráveis de amor e respeito à Ciência Jurídica e à Advocacia. Foi meu examinador em 1978 e, no trabalho que apresentei, havia divergências significativas com estudos anteriores dele. Preocupei-me com isso e meu orientador também. Na banca, ele enfrentou a crítica, discutiu serenamente o assunto e aprovou a dissertação. Posteriormente, na reedição de seu livro, noticiou a mudança e citou-me, demonstrando falta de vaidade à qual sobrepôs o respeito à Ciência do Direito. Noutra feita, fomos advogados ex-adversos, em caso controvertido e quando, timidamente, indaguei, em encontro casual, se iria sustentar no Tribunal, ele me respondeu: nós vamos – você também vai. Precisamos mostrar a importância do nosso caso, engrandecer e dar qualidade ao processo e ao julgamento, justificou. Ensinou, assim, que, acima da preocupação com o adversário, dividindo com ele a cena, deveria colocar-se a valorização do espetáculo da Advocacia, que também deveria ser o do Judiciário. Carrego dele, agora, a saudade, o aprendizado jurídico, o respeito, a humildade, a valorização da Justiça e, mais do que isso, da Advocacia.

domingo, 18 de maio de 2014

Improbidade administrativa

A tônica dos acórdãos que tratam de improbidade administrativa é descrever as condutas de todos que no processo estão como réus e, concluindo haver ato de improbidade, punir a todos igualmente, desconsiderando a conduta de cada qual. Tal proceder está visceralmente errado, pois ninguém pode ser punido além de sua particular atuação. Boas luzes advêm do julgamento do REsp 1.291.954, relator Min. ARNALDO ESTEVES, que firmou: "sendo vários os réus, com atuações diferenciadas para a consecução do ilícito, as sanções devem ser individualizadas."

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Contra o empobrecimento das decisões

Quem milita no contencioso certamente tem sentido como as questões se empobrecem no processo. No seu início e, mais ainda, após a contestação e a réplica, surgem questões jurídicas de enorme importância para a solução das quais se demandaria percuciente exame do tema jurídico. Na medida em que o processo caminha e são atingidas as instâncias superiores, a questão se transforma em questionamentos defensivos da Corte contra o jurisdicionado. Assim, em decisão monocrática recente, relativa à lesão sofrida por um aluno na escola, fruto, segundo o acórdão recorrido, de sua própria culpa (AREsp 313.688, rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, decisão de 6 de maio de 2014), optou-se por tratar o tema como questão de fato, invocando-se, então, a súmula n. 07. Todavia, a partir do que consta da própria decisão, possível seria enfrentar o tema da exclusão ou não da responsabilidade do fornecedor de serviços por culpa exclusiva da vítima quando esta é menor de idade. Talvez seja tempo de se buscar enriquecer a Justiça e o Direito, contando-se para tanto com a ajuda do Judiciário.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Embargos do devedor - garantia do juízo

Decidiu corretamente o STJ: “não devem ser conhecidos os embargos à execução fiscal opostos sem a garantia do juízo, mesmo que o embargante seja beneficiário da assistência judiciária gratuita” (REsp 1.437.078, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 25/3/2014). Tanto, porém, não retira o direito de o devedor se defender, pois o não conhecimento implica decisão terminativa, sem julgamento de mérito, de modo que os mesmos fundamentos poderão ser reiterados, quando o juízo estiver garantido. Melhor seria, pois, não extinguir o processo e sim determinar a regularização, atendendo a requisito de procedibilidade, indicando bem à penhora.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Revista dos Tribunais

A Revista dos Tribunais é a mais importante revista de Direito publicada no Brasil, sendo também uma das mais antigas - a Revista Forense é de 1904 - e surpreendeu a todos os seus assinantes de agora com a súbita redução de seu tamanho. Ultimamente, ela vinha publicando volumes com quase 1.400 páginas, o que, diga-se de passagem, não a fazia ganhar em qualidade. O volume 941, no entanto, veio com 415 páginas. Haverá quem se arvorará, como consumidor, a questionar o tamanho atual, pois renovou sua assinatura julgando ser o tamanho que vinha sendo praticado aquele que iria permanecer. Essa questão à parte, há que se lamentar, muito mais do que isso, que o novo tamanho se faz com a simples eliminação dos julgados dos Tribunais Estaduais, o que é lamentável. A evolução do Direito começa nos Tribunais dos Estados, de modo que a falta de todos é sentida. Todavia, com maior ênfase se sentirá a do Tribunal Paulista que, durante enorme tempo, foi sem dúvida a grande atração da Revista.  

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Erro grosseiro, de verdade

O Tribunal de Justiça de São Paulo, diante de decisão que julgou parcialmente partilha de bens em divórcio e que disse, expressamente, "julgo em parte a partilha de bens" (sic), não conheceu do recurso de agravo de instrumento contra a decisão interposto, entendendo erro grosseiro sua dedução, pois cabível seria a apelação (AI 0158893-41.2013.8.26.0000, rel. Des. SILVEIRO DA SILVA, julgado em 29 de janeiro de 2014). Além da haver ignorado a elementar distinção entre as decisões que são proferidas durante o processo (é o caso da que julga apenas parcialmente o mérito, a partilha, no caso) das que pretendem a ele colocar fim, valorizou o nome que o juiz deu ao decisório, dizendo, então, que "o juiz não só nomeou como sentença [o decisório], como também, ao final, expressamente consignou que por meio do referido decisum estaria ele proferindo julgamento acerca da questão sub judice." Inegável que aí está um erro grosseiro, só que não do recorrente ...
Coisas deste naipe não poucas vezes jogaram no ralo o direito do jurisdicionado.

domingo, 16 de março de 2014

Justiça de primeiro grau

Em fevereiro, foi realizada uma audiência pública em Brasília para discutir a eficiência do primeiro grau de jurisdição. Disse, na abertura, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça, segundo a Tribuna do Direito (março/2014, pág. 29), que "a eficiência do primeiro grau não é um desejo, não é um sonho, é uma obrigação que advém de um dos princípios constitucionais da Administração Pública. Não há direito à ineficiência". Grande alento o discurso traz, mas o que se preconiza como eficiência: a quantitativa ou a qualitativa? 
Só uma delas pode ser considerada eficiência e esta é a qualitativa. Justiça não é indústria com linha de produção. Conta-se, porém, que se cobra de magistrados de primeiro grau decidir. Certo ou errado não importaria. Redondo equívoco. Uma decisão de primeiro grau mal proferida não só cria mais trabalho para a segunda instância, como ainda põe em risco a realização da Justiça, pois, mesmo que a qualidade da segunda instância seja melhor, não é fato certo a reforma da decisão, mesmo porque existem legítimos percalços para o conhecimento do recurso, como também há a presunção de que sempre um juiz deu o melhor de si e agiu com correção, de modo a se pensar mais para mudar do que para não mudar o primeiro entendimento sobre um caso.
A par da busca pela eficiência com qualidade, que deveria ter sido o mote da audiência pública, é de se ressaltar que, nos últimos anos, a Justiça de primeiro grau foi sucateada, ora para se montar e fazer funcionar os Juizados Especiais, ora por ter que emprestar seus componentes como auxiliares de segundo grau, a fim de ajudar a desovar o enorme estoque de casos aguardando decisão nos Tribunais. Esse débito está em aberto e deveria ser honrado. 
Um bom primeiro grau efetivamente contribuirá para a melhora da Justiça, quiçá mais até que um excelente Supremo Tribunal Federal. 

quinta-feira, 6 de março de 2014

O que o efeito suspensivo dos embargos de terceiro suspendem



Decisão do TJSP (AI 2016908-16.2014.8.26.0000, julgado em 26.02.2014, Relator Des. MOREIRA VIEGAS) colocou o dedo na ferida relativamente ao que se suspende com o efeito suspensivo dado ao recurso contra a decisão proferida em embargos de terceiro. Após dizer que “o artigo 520 do Código de Processo Civil determina que as apelações sejam recebidas em seu efeito devolutivo e suspensivo. Porém, tal diploma processual, no mesmo artigo, prevê algumas exceções, das quais não se encontra nenhuma ressalva específica em se tratando de embargos de terceiro”, concluiu o acórdão que se impõe “o entendimento que o duplo efeito deve ser atribuído à apelação tirada em embargos de terceiro, respeitando-se assim o rol taxativo do artigo 520 do Código de Processo Civil”. Foi além disso e pontificou que “o efeito suspensivo atinge somente o processamento dos embargos de terceiro e não a ação principal, ou seja, somente o bem objeto dos embargos de terceiros restará resguardado e impedido de ir à praça”. Precisa a colocação: não haveria o que se suspender senão o quanto pode prejudicar o terceiro atingido por ato de constrição em feito do qual não lhe pode advir prejuízo.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Liberdade de opinião

Decisão da Juíza Lilian Lage Humes, do Foro Central Criminal da Barra Funda, acolheu, em 14 de janeiro último, a manifestação da Promotora de Justiça Flávia Helena Gonçalves Teixeira e determinou o arquivamento de inquérito policial instaurado por representação do Juiz de Direito Carlos Alberto de Campos Mendes Pereira. A representação apontou para o delito de difamação praticado por Clito Fornaciari Júnior, em artigo publicado na Tribuna do Direito, de julho de 2012, sob o título de “A prova desconsiderada e o recurso especial”. O magistrado sentiu-se atingido, de vez que o artigo, que trata da prova não considerada pelo julgador por não a ter visto, destacou o risco que existe de incidirem em erro os demais magistrados, que julgam a causa segundo a versão apresentada pelo relator. Entendeu a Promotora de Justiça que se cuida o texto de um trabalho técnico-jurídico, que analisou uma decisão daquele Juiz, evidenciando-se intuito de debater sua decisão, não se caracterizando crime, que exige intenção de ofender a honra subjetiva alheia. 

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Companheira e o direito à habitação

Duas decisões recentes do STJ, ambas da pena do Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, negaram à companheira o direito à habitação relativamente ao imóvel em que residia com o companheiro falecido (REsp 1.212.121, julgado em 3.12.2013; e MC 21.570, julgada em 5.9.2013). Em ambas as decisões, ressaltou o relator que a lei que vigora ao tempo do óbito é que disciplina o destino dos bens deixados pelo falecido. Presente esta premissa legal, descartou o direito em questão que estava anteriormente previsto na Lei n. 9.278/96, de vez que a mesma foi tacitamente revogada pelo Código Civil. Realmente, o art. 1.790 do Código Civil, que arrola os direitos da companheira e do companheiro, sequer trata deste específico direito. Na regra que seria a única a dispor sobre os direitos sucessórios no regime da união estável nada se lhe concede nessa linha. É certo, porém, que o mesmo Código Civil assegura ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime matrimonial de bens, o direito real de habitação, a ser exercício sobre o imóvel destinado à residência familiar (art. 1.831). Seria um direito restrito a quem casado formalmente foi? E a equiparação constitucional da união estável ao casamento e, pois, dos companheiros aos cônjuges? Transparece aí, sem dúvida alguma, mais um tratamento discriminatório, que justifica seja enfrentado pelos nossos Tribunais.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Ativismo judicial

TIAGO BANA FRANCO registra o ânimo que tomou conta dos estudiosos do Direito Constitucional em versar matérias em que antes não se imiscuíam e conclui que essa transformação redundou numa alteração completa no modo de se interpretar o Direito como um todo. O título de seu trabalho já é uma conclusão - e das melhores, que estimula os que não veem com bons olhos o ativismo judicial a lê-lo para tomar maiores e melhores embasamentos para se contrapor a isso, que entendo ser um grave vírus a corroer nosso sistema:  "Ativismo judicial: a desarrazoada busca do razoável" (Revista do IASP, n. 32, pág. 59 e segs) é o nome e a melhor marca do estudo. Destaque do artigo para os termos curingas e para os princípios de conteúdos indeterminados que tornam impossível prognosticar-se acerca do resultado de qualquer demanda, pois permitem que se leve a romper, sem remorsos, com o texto da lei. Assim, o Judiciário usurpa para si atribuições de outros Poderes, sendo de se temer o risco de se instaurar uma ditadura sua, que poderá ser mais cruel do que a de qualquer outro. O império da lei ainda é - e sempre será, pode vaticinar-se - a maior e melhor garantia de todos.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Prestígio do site

Acórdão do Tribunal de Justiça da Bahia prestigiou o site do Tribunal, dado ser parte integrante do sistema de informações, sendo dotado, pois, de caráter de oficialidade (Revista dos Tribunais, 939/575). Assim, reputou escusável o erro da parte que nele confiou e, deste modo, reputou haver justa causa, hábil para a devolução do prazo para a prática do ato questionado. No caso, o site divulgando o andamento do processo não registrou a data da juntada do aviso de recebimento expedido para a citação da parte.
      Há de ser assim, conforme já sustentávamos nos primórdios da informática no Tribunal de Justiça de São Paulo (Processo Civil: verso e reverso, Juarez de Oliveira, 2005, pág. 79), quando criticamos decisão proferida no julgamento da apelação n. 136.167-4, relator Des. J. ROBERTO BEDRAN, que negou a nulidade de julgamento no qual haveria sustentação oral e ao qual o profissional não compareceu por não estar correta a data declinada no site, comparecendo somente após o julgamento, exatamente na data anunciada no site.