Nestes tempos em que a preocupação dos tribunais é limpar
pauta, não são poucos os casos em que se maltrata, gritantemente, o princípio
do devido processo legal, da plenitude de defesa e do contraditório. Por isso,
acho sempre fundamental que sejam destacados julgados que enfrentem mal desta
ordem, repondo as coisas no seu devido lugar, o que implica prestígio para tais
princípios constitucionais. Isso se estampa em julgado do STF publicado na Revista dos Tribunais 949, páginas 278 e
seguintes.
Trata-se do julgamento do HC 238.918, da relatoria do Min.
GILMAR MENDES, que se realizou em 18 de março de 2014. A decisão a que se chegou,
no entender do advogado CÉSAR PERES, deveria ser melhor, ensejando a
possibilidade de interposição de outro recurso, antes do especial oferecido,
mas, de qualquer modo, o quanto consta do acórdão é suficiente para lembrar que,
acima das estatísticas que cuidam só de números, deve estar o respeito aos
princípios.
Chegou ao STJ, no caso, recurso especial oferecido antes da
divulgação de voto vencido, favorável ao recorrente, no julgamento contra o
qual o especial foi ofertado. Naquela Corte, não se reconheceu vício na publicação
do acórdão, por ser “evidente” e “de fácil constatação” que o julgamento se deu
por maioria. Reconheceu a Min. MARILZA MAYNARD, relatora, que a publicação do
acórdão não se fez completa, mas o ônus de promover a correta integralização do
julgado seria da defesa. Reputou erro grosseiro o recurso interposto, dado que
deveria ter sido antecedido de embargos declaratórios a fim de procurar a
complementação do acórdão, diante de cuja falta proclamou que “dormientibus non sucurrit jus”.
O voto do Min. GILMAR MENDES com isso não concordou e lembrou
que o direito de defesa constitui pedra angular do sistema de proteção dos
direitos individuais e materializa uma das expressões do postulado da dignidade
humana. Desse modo, o homem não pode ser transformado em “objeto de processos e
ações estatais”. Citando PONTES DE MIRANDA, diz “que o direito de defesa não se
resume a um simples direito de manifestação no processo”. Em seguida,
referindo-se a decisão da Corte Constitucional Alemã, diz que a pretensão à
tutela jurídica importa no direito de manifestação, direito de informação, “mas
também o direito de ver os seus argumentos contemplados pelo órgão incumbido de
julgar”. Tanto corresponde, exatamente, ao que está garantido no inciso LV, do
art. 5º, da Constituição Federal. Ademais, conclui ele, a consideração dos
argumentos da parte, à luz da doutrina alemã aplicável também entre nós, exige
capacidade, apreensão e isenção de ânimo, coisas que - é de se aduzir -, aqui entre nós, não são tão
comuns.
Transcrever esse acórdão, não importando a solução a que
chegou, é importante
para que não se esqueçam aqueles que militam no contencioso que ainda têm vigor
e validade aquelas cláusulas constitucionais para as quais muitas decisões dão
de ombros.