Custa crer possa existir uma discussão
em torno da responsabilidade de quem usa cheque de terceiro para a realização
de alguma transação. Todavia, isso foi enfrentado no julgamento do Recurso
Especial n. 1.787.274, da relatoria da Min. NANCY ANDRIGHI. O caso chegou ao
STJ, porque, no julgamento do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, foi
afastada a responsabilidade do emitente de cheques ao fundamento de que
"é prática comum na sociedade brasileira o empréstimo de lâminas de
cheque a amigos e familiares, como expressão da informalidade e da
solidariedade que marcam nosso povo, e que os comportamentos de boa-fé devem
ser protegidos e prestigiados pelo Poder Judiciário".
A decisão, todavia, foi reformada
na Corte Superior, que firmou não ser possível, na ausência de lacuna, o
julgador se valer de um costume para afastar a aplicação da lei, sob pena de
ofensa ao art. 4º da LINDB. No que tange à boa-fé, embora se trate de
princípio fundamental do ordenamento jurídico com conteúdo valorativo e
nítida força normativa, ele não se confunde com os princípios gerais do
direito (art. 4º LINDB), que têm caráter informativo e universal, e
finalidade meramente integrativa, servindo ao preenchimento de eventual
lacuna normativa. Concluiu a decisão assentando que a flexibilização das
normas de regência, à luz do princípio da boa-fé objetiva, não tem o condão
de excluir o dever de garantia do emitente do cheque, previsto no art. 15 da
Lei n. 7.357/1985, sob pena de se comprometer a segurança na tutela do
crédito, pilar fundamental das relações jurídicas desse jaez.
A tese firmada guarda pertinência também para o empréstimo de cartão, prática que, atualmente, chega a ser muito mais comum do que o empréstimo de cheque.
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