O tema da fraude à execução parece que não se supera, mesmo
diante da clareza da lei processual e até do posicionamento adotado em
julgamento repetitivo acontecido em 2014 (REsp 956.943), que, por sinal, apenas
tratou de conferir foros vinculantes ao enunciado da súmula 375 do STJ, dada a
identidade de conteúdo. O questionamento em torno da fraude se faz presente
diariamente e inúmeras vezes nos nossos tribunais e coloca em evidência o
problema da boa-fé.
Repete o entendimento consolidado
velho adágio, segundo o qual a boa-fé se
presume e a má-fé se prova. Certo está, mas não se interpreta-o do mesmo
modo. Em muitos julgados, a má-fé que se considera não é a do adquirente do bem
comprometido com a execução, mas sim do vendedor. Que o vendedor quase sempre
tem má-fé é óbvio, pois, do contrário, não venderia o bem que está se prestando
para o pagamento de sua dívida ou, então, que é o único que tem para dar
sustentação a um processo que se inicia. A má-fé que compromete o ato jurídico,
mantendo o bem sujeito à constrição judicial, é a do adquirente e se revela com
o conhecimento que possui de servir o bem que está comprando para o cumprimento
de uma obrigação, de modo que sua atuação, adquirindo-o, colabora para que se
malogre a satisfação do crédito.
É elementar que a má-fé do comprador,
basicamente o seu conhecimento da situação, pode ser provada por todos os meios
legais, bem como pelos moralmente legítimos. Existem, porém, algumas condutas
ou omissões que, mesmo não resultando provadas, induzem a que se tenha
conclusão sobre a intenção de lesar também do vendedor. Nesse sentido, tanto se
coloca com a falta de pesquisa elementar sobre a situação do alienante, não se
interessando por obter certidões de distribuidores forenses e de cartórios de
protesto, que até já foi de exigência expressa pela Lei n. 7.433/85. A inércia bem
serve para demostrar comportamento desidioso, irresponsável, assumindo supostamente
os riscos de uma transação que pode ser ruinosa também a ele.
Esse comportamento pode e deve ser
interpretado como conduta inegavelmente duvidosa e suspeita, ainda que não intencional, concedendo
claro espaço para a atuação ilícita do alienante. Daí o sistema não pode preservá-lo,
pois as relações jurídicas devem ser protegidas, porém não além dos interesses
de quem não se interessou em proteger-se.