sexta-feira, 22 de março de 2019

O erro do juiz também gera direito


A legislação processual contempla prazos diferenciados para a apresentação de impugnação em processo de cumprimento de sentença. O art. 525 prevê que, transcorrido o prazo para o pagamento da dívida sem multa, terá início o prazo de quinze dias para o devedor impugnar o cumprimento da sentença, independentemente da realização da penhora. No rol do que pode ser impugnado, há a previsão da “penhora incorreta ou avaliação errônea” (inciso IV). Entretanto, o art. 854, tratando da penhora em depósito ou em aplicação financeira, prevê o prazo de cinco dias, apenas, para que o devedor que teve valores bloqueados comprove a impenhorabilidade dos mesmos ou o excesso da indisponibilidade em função da dívida (§ 3º). 
Ao determinar a manifestação do devedor sobre um bloqueio realizado em sua conta, o juiz, alheio à regra especial, concedeu prazo de quinze dias para a impugnação, do qual o devedor veio efetivamente a se valer. Todavia, a parte contrária apontou para a intempestividade da impugnação, o que foi acolhido, dela não conhecendo o mesmo juízo que havia deferido erradamente prazo maior.
A questão foi levada ao TJSP, no qual se acolheu o recurso, fazendo-o com amparo no art.10 do Código de Processo Civil que veda ao juiz decidir com base em fundamento a respeito do qual não se deu oportunidade às partes de se manifestar. Mais diretamente, firmou, no final da decisão, que “a agravante não pode ser penalizada, se agiu exatamente como determinado pelo juiz a quo, ofertando impugnação à penhora dentro do interregno concedido” (AI 2213570-11.2018.8.26.0000, rel. Des. WALTER FONSECA, julgamento em 14.03.2019).
Sem dúvida, a decisão é correta, conferindo a manifestação do juiz, ainda quando errada, direito à parte de agir no prazo e do modo como lhe ensejou a decisão. Repara-se, assim, o direito do recorrente, mas nada supre a perda de tempo do recorrido, que nada teve com o erro do julgador.

sábado, 16 de março de 2019

E a fundamentação?


As posições das Cortes Superiores – na área cível particularmente as do STJ, de vez que a tema constitucional fica distante do cível – são inspiradoras para o bem e para o mal, dado ser sua jurisprudência guia de atuação para os órgãos menores. Essa lembrança vem à mente diante de trabalho doutrinário de LUANA HELENA ROCHA ESTRELA VARGAS e TIAGO FIGUEIREDO GONÇALVES (Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, 88/34), no qual, após cuidadoso exame do requisito da fundamentação das decisões judiciais, apontou-se que “o STJ utiliza-se dos mesmos entendimentos para legitimar posições distintas, ora em conformidade com o CPC, ressaltando a manifestação do julgador sobre todas as alegações aventadas, ora em defesa da desnecessidade de tal postura”. Gera essa postura inegável incerteza no âmbito do próprio Tribunal Superior, de modo a ser pertinente concluir-se, como lá se concluiu, contribuir ela para tornar as posições tanto mais incertas nas instâncias inferiores, onde existe um grau de devolutividade e um número de processos maiores, o que torna o controle muito mais difícil de ser realizado.
            Caminha, pois, a fundamentação para ficar como um simples adorno a ser utilizado pela magistratura quando der tempo e o expediente estiver em dia, ou seja, sabe Deus quando.