domingo, 13 de outubro de 2019

Prescrição: dever do juiz


O Informativo de Jurisprudência n. 0656 do STJ traz notícia de julgamento sob a relatoria do Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE (REsp 1.749.812, decidido em 17/09/2019) do qual resultou a seguinte ementa: “Prescrição. Declaração de ofício pelo juiz. Faculdade. Violação literal de lei. Inocorrência. Exceção substancial não suscitada pela parte beneficiária. Ação rescisória. Não cabimento.” Cuida-se de recurso oferecido contra decisão que rejeitou ação rescisória, na qual se apontava a violação ao § 5º, do art. 219, do então Código de Processo Civil, que, modificando o texto originário da lei processual de então, firmou "o juiz pronunciará, de ofício, a prescrição".

Entendeu o julgado, conforme nota à decisão, que “a norma processual que possibilita a declaração da prescrição, de ofício, pelo juiz, estabelecida no Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 219, § 5º, não encerra um dever do magistrado. Trata-se, pois, de matéria circunscrita à disposição das partes, sobre a qual o juiz não pode se sobrepor, ainda que motivado pela celeridade/efetividade processual, sob pena de incorrer em manifesto desvirtuamento do instituto, o qual se relaciona, intrinsecamente ao direito material das partes interessadas.”

Não parece correta essa colocação, pois claro está na lei, inclusive com o uso impositivo do “pronunciará”, que se modificou o regime da prescrição, deixando de ser matéria de interesse exclusivo da parte para se transformar em matéria de ordem pública, no afã de eliminar os processos pela simples demora na sua propositura. Dessa forma, se a parte tiver a intenção de não se valer da prescrição, vista muitas vezes como expediente de devedor desonesto, terá que renunciar ao direito de usar do instituto (art. 191 CC), seja declarando essa sua intenção, seja praticando ato, antes do processo, que deixe claro não pretender valer-se da alegação. Se assim não proceder e igualmente nada alegar no processo, será de rigor que o juiz pronuncie a prescrição, pois a lei não contém letra morta.
  
O termo final de sua alegação e, pois, também do conhecimento de ofício pelo juiz é mesmo o do encerramento das instâncias ordinárias, não pelo instituto em si, mas pelo âmbito de devolutividade dos recursos especial e extraordinário. Aliás, igual limitação também se dita à alegação de falta de condições de admissibilidade da ação ou nulidades processuais. Existe, assim, uma preclusão, que se reputa máxima com o trânsito em julgado, mas que, por óbvio, não impede trazer o tema para a ação rescisória, cuja função e razão de ser é exatamente abrir ensejo a eliminar mesmo as preclusões máximas eventualmente ocorridas. Logicamente aí não será local para simplesmente alegar a prescrição, mas, sem dúvida alguma, dizer que o juiz (das instâncias ordinárias) violou a lei que determinava a ele, se fosse o caso, pronunciar a prescrição.

Não se mostra adequado afirmar, em se tratando de prescrição, que “ao juiz não se impõe o dever de deliberar sobre matéria de livre disposição das partes”, pois sobre a prescrição as partes têm disponibilidade sobre o assunto antes do processo, podendo renunciar expressamente ou deixar perceber por atos inequívocos que a ela está renunciando, mas no processo não mais a tem. Levado o tema, sem prévia renúncia, ao processo, cabe ao juiz pronunciá-la de ofício.  

No âmbito da rescisória, não há que se alegar simplesmente a prescrição: cabe demonstrar que havia prescrição e o juiz não a pronunciou, o que se faz possível ainda que o tema não tenha sido enfrentado no juízo originário, pois a rescisória não exige prequestionamento.