segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Responsabilidade sem culpa impõe interpretação restritiva

O TJSP confirmou decisão da Comarca de Votuporanga e manteve, diante de acidente de veículo causado por culpa recíproca do condutor de um ônibus e do que conduzia a motocicleta que foi colhida, a condenação de uma empresa, cujos funcionários eram transportados por empresa para a qual trabalhava o motorista do ônibus (Apelação n. 0001662-25.2015.8.26.0664, rel. Des. ALFRETO ATTIÉ, julgado em 27.07.2017). O motorista foi condenado por ter agido com culpa; a empresa transportadora, como empregadora do causador do acidente; e a segunda empresa por se ver uma relação de preposição, dado que o ônibus estava a serviço dela, transportando seus empregados, quando do evento.
A tanto não parece correto se ter chegado. A empresa que contrata outra para lhe servir não poderia ser condenada, pois não guarda qualquer relação de dependência ou preposição com o causador do acidente, reconhecido como culpado, e também com a empresa para a qual ele trabalhava, servindo-se de ônibus de propriedade daquela. A relação entre as duas empresas é contratual e, portanto, equilibrada, sem submissão de uma a outra. Não havendo subordinação não pode existir responsabilização. Nessa linha, jamais seria dado à contratante impor regras, ditar preceitos, programar os trabalhos ou administrar os funcionários da outra, de modo que não seria a transportadora uma preposta sua, que agiria sob o seu comando.
O que o art. 932, III, do Código Civil assegura é a obrigação de quem tenha vínculo com o causador do fato, como é o caso da transportadora e seu funcionário, não admitindo, todavia, que se crie uma segunda escala de relacionamento, de modo a se atingir quem tinha relação com quem já está sendo condenado como responsável sem culpa.
O objetivo da lei é ampliar a responsabilidade, comportando, pois, por ser um caso de responsabilidade sem culpa, interpretação restritiva que não se compraz com a extensão da responsabilidade a quem tem ligação negocial com quem responsabilizado já está sendo por extensão. 

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

DANO MORAL E O PASSAR DO TEMPO

O STJ voltou a considerar um tema que, muito amiúde, é invocado como argumento para enfraquecer a pretensão em juízo deduzida. É comum, nessa linha, criticar e desmerecer a pretensão do autor por ter demorado longo tempo para promover a ação, chegando quase ao prazo prescricional. Colocações desta ordem ignoram que no Brasil não existe prescrição gradual, de modo que o direito permanece hígido até o último dia do prazo para a propositura da ação.
Noutra linha de consideração, já houve quem negasse a possibilidade de se indenizar dano moral quando o fato tivesse ocorrido há muitos anos, entendendo-se então que o dano moral indenizável é o atual (cf. CARLOS ROBERTO GONÇALVES, Responsabilidade Civil, São Paulo, Saraiva, 6ª edição, 1995, n. 91, p. 392), sendo o tempo, efetivamente, o remédio para todos os males.
 Posteriormente, caminhou o próprio STJ para o entendimento, segundo o qual, “o decurso do tempo diminui, e às vezes até faz cessar, o sofrimento resultante do falecimento de uma pessoa da família” (3ª Turma, REsp 284.266, rel. Min. ARI PARGLENDER, Revista Dialética de Direito Processual, 40/142). Consolidando, posteriormente, aquele Tribunal como posição a de que "a demora na busca da reparação do dano moral é fator influente na fixação do quantum indenizatório, a fazer obrigatória a consideração do tempo decorrido entre o fato danoso e a propositura da ação" (EREsp n. 526.299, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, Corte Especial, DJe de 5/2/2009).
Agora, acórdão da Terceira Turma do STJ, opôs-se à aplicação desta tesa em processo envolvendo menores, que, evidentemente, não tinham contra si a questão da prescrição, mas poderiam ser atingidos pela redução do valor pleiteado. A decisão, da Relatoria do Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (REsp 1.529.971, decisão de 19/09/2017), deparou-se com o assunto em demanda promovida 17 anos após o fato danoso, e concluiu que a tese da redução não se aplica ao caso em espécie.
Nessa linha, entendeu que a redução do montante indenizatório em virtude do grande lapso temporal havido entre o fato danoso e a dedução, em juízo, do correspondente pedido indenizatório só se justifica quando tal circunstância tiver o condão de revelar verdadeira desídia da parte autora, que eventualmente possa ser tomada, por isso, como indicador de que os danos morais por ela efetivamente suportados não tenham a dimensão que teriam em regulares condições.
Acrescente-se ao quanto fundamenta o julgado a circunstância de que muitas vezes os responsáveis pelos menores temem ajuizar uma ação sem ter a convicção de que uma demanda, buscando indenização, seja também a vontade dos filhos, que podem, futuramente, não se sentirem confortáveis por ver o dano por eles sofridos exposto um processo judicial. Atuei em um caso de erro médico num parto, onde o pai nunca quis demandar – e quando o filho chegou a maioridade o fez – porque se sentia culpado por haver escolhido aquele médico para dar à luz o seu filho.
A decisão do Min. VILLAS BÔAS CUEVA, além de outros aspectos, sem dúvida, valoriza e dignifica a vontade e a intenção daquele que, em última análise, foi quem  sofreu efetivamente o dano moral. 

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Previdência Privada e inventário

Substanciosa decisão da Primeira Câmara de Direito Privado do TJSP, da relatoria do Des. ENÉAS COSTA GARCIA (julgamento em 18.09.2017), enfrentou a discussão sobre a natureza jurídica da previdência privada: se tem natureza securitária, de modo a ficar para o beneficiário indicado; ou se é aplicação financeira, sujeita pois ao regime comum dos investimentos, em caso de morte do aplicador ou de sua mulher, no casamento com comunhão de bens. No caso (AI 2034728-43.2017.8.26.0000), embora tenha sido lembrado o entendimento assente, dispensando a previdência do processo de inventário, concluiu o julgado por ser dever perquirir sobre cada situação, "especificamente verificando se não haveria, por meio da constituição do fundo, burla às limitações do direito de testar (v.g. preservação da legítima) ou direito de terceiros". Concluiu, então, dever buscar-se a intenção do aplicador, lembrando dos novos entendimentos sobre comunhão das verbas trabalhistas, firmando, então, que, no caso, os aportes eram decorrentes de rendas de trabalho do casal, de modo que a aplicação realizada objetivaria criar uma distinção que só a origem da verba não permitiria.

domingo, 10 de setembro de 2017

Recuperação judicial e supressão das garantias

O instituto da recuperação judicial, tal qual no passado ocorria com a concordata, provoca incidentes relativamente à possibilidade de os credores que possuem garantias reais ou fidejussórias prosseguirem em suas ações individuais ou intentarem-nas, ignorando o processo da recuperação. O tema já foi enfrentado pelo STJ em julgamento repetitivo, realizado com base no art. 543-C do CPC/73. Naquela ocasião, restou firmado que “a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005” (2ª Seção - REsp 1.333.349, Rel. Min. LUÍS FELIPE SALOMÃO, julgado em 26/11/2014).
Recente decisão da Terceira Turma do STJ (13/09/2016), da relatoria do Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, vem reacender a polêmica. A questão chegou ao STJ a partir de decisão do TJMT, que firmou, na esteira de precedentes, a interpretação do art. 50, § 1º, da Lei de Falências, no sentido de que “na alienação de bem objeto de garantia real, a liberação da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante anuência expressa do credor, de acordo com o disposto no artigo 50, § 1º, da nova Lei de Falências (Lei n. 11.101/2005).” Desse modo e assim também foi a conclusão do julgado, em relação aos credores que discordaram do plano de recuperação não há que se pensar em supressão das garantias reais vinculadas aos seus créditos, nem em suspensão da exigibilidade das obrigações definidas por novação no plano, mesmo enquanto a devedora o estiver cumprindo.
Decisões anteriores do próprio STJ admitiam o desaparecimento da garantia diante da concordância expressa do próprio credor com garantia que da assembleia participasse. Decisão da relatoria do Min. PAULO DE TARSO (REsp 1.388.948) firmara: “O interesse dos credores/contratantes, no curso de processo recuperacional, é preservado pela sua participação na assembleia geral, quando então poderão aquiescer com a proposta, se lhes for favorável, alterá-la parcialmente, ou remodelá-la substancialmente, desde que a maioria e o devedor com isso consinta e a proposta não venha a afetar apenas aqueles que da assembleia não participaram”. Prestigiava-se, pois, a redação do § 1º do art. 50.
A decisão de agora, no entanto, altera o panorama em função do quanto disposto no § 2º do mesmo artigo, valorizando, pois, a decisão da assembleia pela classe de cada um dos créditos, dando-lhe poderes decisórios com vinculação de todo o grupo, independentemente da posição que tenham tomado seus membros individualmente. Dessa forma, prestigiou o decidido na assembleia, vinculando àquele resultado não só os credores que concordaram com o plano, mas também os presentes que com ele não concordaram e também os ausentes, de modo a fazer desaparecer as garantias, mesmo com uma decisão da maioria apenas. Divergiu dessa posição o Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, que persistiu com o entendimento anterior, no sentido de não prejudicar os credores que não aderiram ao plano de pagamento da devedora.
A questão, todavia, não foi ainda decidida definitivamente. Em sede de embargos de declaração, dentro ainda da Terceira Turma, houve acentuada divergência, de modo que até mesmo houve voto que acolhia os declaratórios com caráter infringente, de sentido do voto do Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. Seguiram-se, porém, embargos de divergência, levando a controvérsia à Segunda Sessão, tendo o recurso sido distribuído recentemente à Min. MARIA ISABEL GALLOTI.
A força da decisão que advier do julgamento dos embargos de divergência será enorme, daí a importância de se ter, para prestígio do crédito, que reconhecer a força da contratação, que não pode desaparecer sem a vontade de quem contratou e muito menos por uma assembleia de credores que, naturalmente, estarão sendo movidos pelos seus próprios interesses, de forma a não ser possível desprezar os interesses de cada qual no seu próprio negócio.
O resultado da assembleia não pode chegar ao ponto de retirar garantias de quem dela não participou, embora tivesse possibilidade de fazê-lo. Embora cumpra ao Judiciário fazer um exame do resolvido na assembleia sob o prisma da legalidade, também nessa vertente se coloca a proclamação de quem pode ser atingido pelo lá resolvido. Isso também é um aspecto da legalidade e como tal está dentro do âmbito da atividade jurisdicional.

sábado, 5 de agosto de 2017

Tribuna do Direito - 24 anos

Perde o mundo jurídico a Tribuna do Direito, fruto do trabalho abnegado de Milton Rondas que, durante muitos anos, coletava e distribuía por páginas incertas de O Estado de São Paulo matéria jurídica. Depois, passou a sistematizá-las num caderno, nominado de Justiça, e quando o Estadão se rendeu ao lucro e acabou com o caderno por falta de patrocínio, Milton e dois outros mosqueteiros resolveram assumir a empreitada e criaram a Tribuna. Sabia que rico não ficaria, mas ousou, por tantos anos, difundir o pensamento jurídico entre tanta gente, boa parte dos quais que tinham na Tribuna certamente sua única fonte de conhecimento jurídico. Agora, o crescimento da internet e a eterna crise brasileira impõem, mesmo com a resistência do Milton, fim ao projeto, que sem dúvida será sempre lembrado como uma referência impar no jornalismo especializado, conseguindo sobrevier por mais de 24 anos.  Tive a honra de estar com a Tribuna na sua vida toda, mesmo quando dela me afastei por alguns anos ao não aceitar um critério de Milton sobre as eleições da OAB. Nela não escrevia, mas a lia e guardava com proveito e carinho. Tive tempo, porém, de voltar por insistência do Milton e ainda escrever 196 artigos no Caderno de Jurisprudência. Terei saudades, mas também terei boas lembranças para contar. 

domingo, 23 de julho de 2017

Honorários abusivos geram dano moral

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região confirmou a sentença de primeiro grau que julgou procedente ação civil pública intentada pelo Ministério Público contra cobrança abusiva de honorários advocatícios em ações previdenciárias (processo n. 0003105-09.2008.4.01.3502 rel. Des. Souza Prudente). A decisão, publicada na Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, vol. 29, pág. 128, destaca a legitimidade ativa do Ministério Público, por se cuidar de interesses individuais homogêneos, e a competência da Justiça Federal, em função da legitimidade do autor. No mérito, entendeu haver abusividade contra pessoas com vulnerabilidade financeira e faixa etária bastante alta, vendo na atuação da profissional verdadeira extorsão. Adequou a questão ao Código do Consumidor e, assim, penalizou a advogada, por ter faltado ao princípio da boa-fé, anulando a cláusula contratual em que se previa os honorários e impondo indenização por dano moral, mesmo porque também abalou a imagem da Justiça Federal, frustrando as expectativas legítimas do jurisdicionado.

domingo, 9 de julho de 2017

Penhora de salários

Acórdão da relatoria do Des. ALEXANDRE LAZZARINI, no TJSP (Agravo de instrumento n. 2101793-89.2016.8.26.0000, julgamento em 24.03.2017), sem considerar o efetivo montante de vencimentos do devedor, posicionou-se no sentido de dever ser feita uma análise com cautela das hipóteses de impenhorabilidade contidas no art. 833 do CPC. Lembrando do objetivo da impenhorabilidade, qual seja, a garantia de um mínimo necessário à manutenção do devedor, concluiu a decisão que a manutenção da impenhorabilidade absoluta, implicaria retirar do processo de execução sua efetividade, que é buscar o cumprimento das obrigações contraídas. Afastou a ideia de que seria intangível a remuneração e determinou a penhora em 30% dos rendimentos da aposentadoria do devedor para pagamento de honorários de sucumbência e, após a quitação destes, em 15% do mesmo rendimento para pagar o restante da dívida lançada em seu nome, sem que esta tenha natureza alimentar. Preocupou-se vivamente com a finalidade do preceito e confirmou este entendimento também em função de não haver sido demonstrada a insuficiência da aposentadoria para o sustento do devedor. Rompe, pois e bem, a decisão com o engessamento imposto pelo § 2º do art. 833 do CPC, que admite a penhora de salários, soldos, pensões etc., quando supere seu valor a casa de cinquenta salários mínimos. Todavia, a abertura do parágrafo em questão, considerando um teto e, assim, não mantendo o salário (lato sensu) como impenhorável, permite mesmo que se vai além, como se foi no aresto mencionado, de modo a não se dar lugar à falta de efetividade da execução, que é tudo quanto se espera para que se tenha credibilidade no processo e na Justiça.

terça-feira, 27 de junho de 2017

Redução das astreintes - critério objetivo

Está assente no STJ que a multa cominatória não tem caráter indenizatório, de onde decorre a possibilidade de ser mesma alterada, uma vez que seu objetivo é apenas persuadir o devedor de obrigação de fazer e não fazer a adimpli-la.
Recente decisão (AgInt nos EDcl no Recurso Especial n. 1.582.033, rel. Min. MARCO BUZZI, julgado em 23.05.2017), por maioria de votos, contudo, apontou critérios para o aumento do valor da multa, que havia, antes, sido reduzido por decisão monocrática, que nada tem com a finalidade da imposição. Valorou o julgado o fato de a diminuição proposta chegar ao ponto de a vencedora ser obrigada a devolver parte da multa, que levantou de boa-fé, dado que já procedeu ao levantamento de substancial valor. Aduziu, outrossim, que a estimativa do relator sorteado representaria pouco mais de 6% do montante atualizado devido. Por fim, lembrou do prejuízo financeiro para a credora que, com isso, teria prejudicadas suas atividades, aduzindo que se trata de entidade sem fins lucrativos que presta serviços filantrópicos.  Tudo isso beneficia a credora, levando-a ao enriquecimento sem causa, que, a todo custo, cumpre seja evitado.
Se a finalidade da multa não é indenizatória, nada do que se colocou na decisão tem relevância, pois não se tratava de dar algo à credora, mas sim fazer com que o devedor cumprisse a obrigação que não era de pagar, mas sim de não fazer. 
A redução e o aumento podem ter lugar, mas o critério é unicamente o da proporcionalidade com a obrigação principal e a razoabilidade, sem qualquer sorte de subjetivismo, que só teria sentido se fosse para definir indenização.

sábado, 17 de junho de 2017

Advertência desnecessária e deselegante

É profundamente constrangedora a advertência que aparece em inúmeras decisões monocráticas do STJ, o Tribunal da Cidadania, dizendo: “Advirta-se que eventual recurso interposto contra esta decisão estará sujeito às normas do NCPC, inclusive no que tange ao cabimento de multa (arts. 1.021, § 4º e 1.026, § 2º)”. O objetivo é um só: intimidar. Essa deselegante lembrança é o mesmo que pedir para que as pessoas sumam da frente dele, senão vão sofrer ao ver o que lhes acontecerá. Mais honesto seria aplicar a multa, quando merecido, mas sem a advertência, mesmo porque ela já está na lei e ninguém pode defender-se alegando desconhecer o texto legal. Talvez seja o caso de, se precisarmos recorrer dessa decisão, lembrar o intimidador relator de que, como ele não é infalível, a lei, com a sapiência de algumas centenas de anos, coloca vários outros recursos depois da decisão dele. Ah, bom também lembrar-lhe que até em Brasília ainda há juízes.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Mandado de segurança e agravo de instrumento

Sobre o cabimento de mandado de segurança como sucedâneo recursal para os casos de não cabimento de agravo de instrumento, tendo em vista a mudança da sistemática recursal, que passou a admitir o agravo somente nos casos taxativamente arrolados no art. 1.015 do CPC ou, expressamente, em outra disposição, o TJSP vem de dar resposta que, ainda que não se possa admitir como correta, é criativa. Assim, no julgamento do mandado de segurança n. 2094519-40.2017.8.26.0000, sob a relatoria do Des. LEONEL COSTA (decisão em 14.06.2017), restou firmado que o rol legal dos casos de agravo não esgota a possibilidade de recorrer das decisões ali não declinadas, de vez que, mesmo nesses casos é cabível o enfrentamento das decisões no futuro recurso de apelação, in verbis: “O Novo Código, no entanto, não impede que tais questões sejam apreciadas em grau recursal na medida em que admite sejam elas suscitadas em preliminar de apelação ou na resposta à apelação (cf. artigo 1.009, § 1º, CPC). Isso quer dizer que as decisões não contempladas por meio de agravo de instrumento poderão ser atacadas através de apelação e serão apreciadas em sede recursal; alterou-se, apenas, a sistemática e o momento de apreciação”. É um entendimento diferente que, todavia, não supre o risco de dano irreparável que poderia ser evitado com o uso do mandado de segurança, desde logo, sem se submeter o vencido à longa espera sem recurso e, pois, deixando seu direito a correr risco.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Desconsideração e responsabilidade de administrador

Preciosa lição distinguindo a simples responsabilidade (especificamente de dirigente de instituição financeira) da situação de desconsideração da personalidade jurídica se tem em acórdão do STJ da pena da Min. NANCY ANDRIGHI (REsp 1.036.398). Em síntese, lá se tem que a desconsideração da personalidade jurídica não é regra de responsabilidade civil, mesmo porque não depende de prova da culpa. Ela atinge aqueles indivíduos que foram efetivamente beneficiados com o abuso da personalidade jurídica, sejam eles sócios ou meramente administradores de uma sociedade. A responsabilidade, ao contrário, não exige este proveito, este benefício, mas apenas culpa. Desta forma, o administrador de entidade financeira que tenha contribuído culposamente, de forma ilícita, para lesar a coletividade de credores, sem auferir benefício pessoal, sujeita-se à ação do art. 46, Lei 6.024/74, mas não pode ser atingido propriamente pela desconsideração da personalidade jurídica.

quarta-feira, 24 de maio de 2017

Honorários pelo novo CPC

O STJ e vários outros Tribunais vacilaram quanto à aplicação no novo Código de Processo Civil às questões de honorários, chegando a estabelecer até mesmo que a aplicação se daria somente com relação às demandas intentadas já sobre a vigência do novo Código. Em acórdão publicado em abril último, no entanto, a questão obteve outro rumo, mesmo que a partir de decisões pretéritas que dela cuidavam sob a égide de outros diplomas legais. No julgamento do REsp 1.636.124, da relatoria do Min. HERMAN BENJAMIN (julgamento em 06/12/2016, DJe 27/04/2017), firmou-se que “os honorários nascem contemporaneamente à sentença e não preexistem à propositura da demanda. Assim sendo, aplicar-se-ão as normas do CPC/2015 nos casos de sentença proferida a partir de sua vigência.” Lembrou-se que a Corte Especial do STJ se posicionou que o arbitramento dos honorários não configura questão meramente processual, mas de mérito apta a formar um capítulo da sentença (REsp 1.113.175, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 7/8/2012). A partir do estabelecimento de sua natureza jurídica fixou-se marco temporal para a aplicação das novas regras, estabelecendo que a sucumbência é, portanto, regida pela lei vigente na data da sentença (REsp 783.208-SP, Rel. TEORI ZAVASCKI, DJe 21/11/2005).


quinta-feira, 18 de maio de 2017

Eficácia da Convenção de Condomínio

A força da Convenção de Condomínio foi colocada em segundo plano diante da “prática social” por acórdão proferido pelo TJSP (apelação n. 0000662-80.2015.8.26.0634, rel. Des. ARTUR MARQUES, julgado em 08.05.2017). Discutia-se, no processo, a construção de um muro numa altura superior à prevista na Convenção, tendo o requerido alegado que já a maioria dos condôminos não respeitava aquela regra. Entendeu o julgado, diante disso, que “o costume não pode revogar norma, certo também que a prática social reiterada a torna ineficaz”.
O costume, em certas situações, tem força de lei, dignidade que não se confere a tal “prática social”, parecendo claro que a conclusão do julgamento ofende o quanto disposto expressamente tanto pelo art. 1.333 do Código Civil, que diz tornar-se obrigatória com o registro a convenção até para terceiro, como também pelo art. 1.351, que coloca quórum qualificado para a sua simples alteração, evidenciando, portanto, o seu vigor, que não condiz com a possibilidade de ser considerado ineficaz em função de seu desrespeito. 

domingo, 7 de maio de 2017

Execução e terceiro

Revendo decisão da Comarca de Taquarituba (1a Vara - processo n. 0002664-65.2015.8.26.0620), salta aos olhos um equívoco relativamente à posição de terceiros em processo de execução. 
No caso, rejeitou o magistrado a oposição de embargos à arrematação por terceiro adquirente do bem penhorado, supostamente em fraude à execução, por entender que o remédio que se lhe permitia era o dos embargos de terceiro. A questão, todavia, tem posicionamentos doutrinários e jurisprudencial bastante claros, a ponto de ARRUDA ALVIM dizer que o problema é de "constatação trivial", que, sem dúvida, não ocorreu no julgamento em tela. 
É certo, pois, que os embargos de terceiro são mesmo pertinentes, mas apenas quando pretende o terceiro discutir a sua colocação ou a colocação de seus bens como respondendo por dívida que não é sua. Todavia, se já foi definida a responsabilidade de seus bens pela dívida de outrem, tem-se um caso de responsabilidade secundária, de modo que ele pode usar dos mesmos meios deferidos ao devedor primário para defender aquilo que poderia também ser defendido por aquele devedor.
No caso, o terceiro atacou vício do edital de praça e, ainda, o valor da arrematação, questionamentos que ele fazia em defesa de direitos e interesses próprios, de modo que bem poderia servir-se dos embargos à arrematação. 
O terceiro não vem carimbado como terceiro, sua colocação depende do que ele pretende do processo.

terça-feira, 28 de março de 2017

Fé pública é eficaz até contra a verdade

Acórdão do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp 735.005, rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, sessão de 16.03.2017) apegou-se a uma certidão ostensivamente com a data errada da publicação de uma decisão para não conhecer de agravo em recurso especial, a pretexto de haver sido deduzido antes da publicação da ato recorrido. A parte, por meio de agravo interno, apresentou exemplar do jornal, mostrando que a data da certidão não era correta, nem com o que obteve êxito. Contrapôs-se à evidência o voto condutor do acórdão dizendo que "a irresignação do ora agravante não merece guarida, uma vez que a mera juntada da cópia do Diário da Justiça eletrônico não é apta a comprovar a tempestividade do agravo em recurso especial, haja vista que a certidão exarada pelo Tribunal de origem (e-STJ fl. 597) detém fé pública".

Teria passado o tempo em que a demonstração da verdade retirava a fé pública da certidão?

quinta-feira, 23 de março de 2017

Honorários de sucumbência

Já foi falado algumas vezes das vantagens que o novo CPC teria propiciado aos advogados. Comemorou a própria OAB o novo texto, considerando-o como o Estatuto - II. O texto, é inegável, não deixa de ser generoso para os advogados, principalmente no que tange aos honorários. Entre o texto, porém, e sua aplicação existe uma enorme distância e é aí que mora o perigo. Nesse sentido, acabo de ler decisão do TJSP proferida em julgamento de Embargos de Declaração (n. 0019429-08.2011.8.26.0344.50000, rel. Des. BERETTA DA SILVEIRA, julgamento em 23.02.2017), nos quais o embargante pretendia, como vencedor da causa, receber honorários mínimos de 10% sobre a condenação. A decisão reconheceu a lei, falou do valor a que, no caso, se chegaria, mas negou o direito dizendo: "em relação à verba honorária arbitrada, insta esclarecer que, por mais que o diploma legal imponha a condenação em patamar não inferior a 10 (dez) e não superior a 20% (vinte por cento) do valor da causa, em casos extremos, de rigor a apreciação equitativa do valor a ser arbitrado, em respeito ao postulado da proporcionalidade e ao princípio que veda o enriquecimento sem causa."

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Execução injusta - indenização

Há duas situações diferenciadas no sistema processual que importam em pagamento pelas partes além daquele sobre o qual se demanda. Justificam-se por razões diversas, uma como responsabilidade inerente ao processo e decorrente da simples derrota, envolve custas, honorários e despesas processuais (art. 85); outra que supõe deslealdade, má-fé, de modo a poder ter lugar, ainda que a parte faltosa sagre-se vencedora (arts. 79 a 81). Diante desses dois extremos como colocar o art. 776, que determina, apenas para as execuções, o pagamento de indenização por dano, diante da circunstância de haver sido demandado sem razão (obrigação inexistente)? 

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Sustentação oral

O STJ, por meio da Emenda Regimental n. 25, de 13 de dezembro de 2016, alterou a redação do art. 158 de seu Regimento Interno, que cuida da sustentação oral na Corte, prevendo que deve o interessado requerer sua realização, até dois dias úteis após a publicação da pauta de julgamento. Trata-se de previsão restritiva não constante do Código de Processo Civil, que prevê simplesmente que no julgamento será dada a palavra ao recorrente e ao recorrido para sustentar suas razões, nos recursos em que, segundo o rol do Código, tanto é permitido (art. 937). Segundo a justificativa dada ao novo texto, com a disciplina se procura ordenar o crescente volume de requerimentos para sustentação oral. Certamente a nova previsão merecerá questionamentos, sendo curioso que ela se apresenta como vantajosa em si mesma e por também assegurar certas preferências a quem as possui, mas sem dúvida a restrição existe, uma vez que o não requerimento com a antecedência exigida impedirá sua realização. Com isso também se impede que o advogado que, em princípio, não realizaria a sustentação e o faria apenas se a parte contrária o fizesse, possa deixar de requerer e simplesmente comparecer à sessão de julgamento e aguardar a inscrição do ex-adverso. Assim procedendo, não lhe será dada a palavra, de modo que se lhe impõe requerer e, se for o caso, do pedido desistir.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Teori Zavascki

A morte de TEORI ZAVASCKI causa em mim uma tristeza muito grande, não pelo que ele estava fazendo para o Brasil, mas por conhecê-lo há muitos anos. Participamos juntos, em 1976, do concurso para advogado do Banco Central do Brasil. Fomos aprovados, nomeados e lá trabalhamos, ele no Rio Grande do Sul e eu aqui em São Paulo. Antes de mim, TEORI deixou o Banco e caminhou para a Magistratura. Acompanhei, mesmo que à distância, sua atividade profissional, que sempre se marcou pela retidão, dedicação e estudo. Do Tribunal Federal da 4ª Região galgou o STJ e, depois, o Supremo, coroando sua trajetória de trabalho com muito empenho e honestidade. Nunca deixou de estudar: a última vez que com ele estive, no final do ano na AASP, não conversamos sobre os processos da mídia. Falamos do novo Código de Processo Civil e ele revelou as mesmas angústias sentidas por quem cultua o processo. Era sensato e sereno e assim continuará na nossa imagem.