sexta-feira, 15 de maio de 2020

Honorários ad exitum: tema que não se supera



Constantemente se renova um tema de que já tratamos em várias oportunidades: a remuneração do advogado contratado ad exitum, mas que tem revogada sua procuração antes do término do processo. Decisão do TJSP (Processo n. 1008217-40.2017.8.26.0189) acolheu a apelação do contratante, negando a remuneração ao profissional, embora reconhecesse ser a contratação de advogado com remuneração em função do êxito ato jurídico sob condição, evento futuro e incerto, cuja ocorrência dará ensejo à remuneração do profissional. O julgado expressamente citou o art. 125 do Código Civil, reproduzindo seu conteúdo, mas não se ateve ao que dispõe o art. 129, que completa o regime jurídico da condição, dando consequência ao ato unilateral de quem contrata.

O art. 129 do Código Civil reputa ocorrida a condição se seu implemento foi obstado pela parte a quem desfavoreça (ficção do implemento da condição). É a situação que se tem no referido processo, onde o rompimento do contrato foi imotivado e teve lugar antes do término dos trabalhos, impedindo, pois, totalmente a condição acontecer.

Tal circunstância importa em malícia, oportunismo, uma vez que afastando o profissional que trabalhava nos casos sem nada até então ter recebido, locupleta-se com isso, recebendo os processos com andamento mais avançado do que aquele que se apresentava quando o advogado fora contratado. A malicia, no caso, permite o locupletamento com o trabalho alheio, o que seria afastado em se permitindo o arbitramento de honorários para estimar quanto o que foi produzido.

Não se exige para a incidência da previsão do art. 129 da lei civil ato ilícito da parte, conduta desleal ou abuso da situação, basta, objetivamente, ter consciência de que de um ato permitido possa advir uma vantagem que soará indevida. É suficiente, pois, a constatação de proveito que a situação enseja.

Essa regra prevalece até mesmo sobre a literalidade de cláusula contratual que condiciona a percepção de honorários ao resultado do processo, devidamente realizado. Cláusula nessa linha tem sentido na vigência do contrato, a fim de não permitir que reclame o profissional pagamento se nada recebeu o seu cliente, após se lhe permitir atuar no feito até seu final, ou seja, em condições de realizar a condição mercê de seu trabalho.

Com o rompimento do contrato a cláusula não tem mais sentido, mesmo porque a ninguém é dado locupletar-se do trabalho alheio, notadamente porque o advogado é profissional e a ele a lei garante o direito à percepção de honorários, consoante decorre do art. 22 da Lei n. 8.906/94. A lei disciplinadora do assunto garante a remuneração e permite o ajuste entre as partes sobre como se dará o seu pagamento, mas não permite, logicamente, que, por mero ato de vontade, uma das partes suprima a remuneração pelo serviço, que é o que acontece com o rompimento do contrato com trabalhos desenvolvidos e que tem valor, por se prever a contrapartida da remuneração.

O art. 129 não enseja espaço à cláusula contratual da não-remuneração, na medida em que esta permite o enriquecimento de quem recebe um serviço que diminuiu o espaço e a atividade até a consecução do resultado do processo e a obtenção do resultado.

Inegável, pois, o direito do profissional à remuneração pelo trabalho e pela qualidade do trabalho realizado sem qualquer pagamento prévio ou contemporâneo a esta atividade, pois a rescisão contratual não pode impedir que isso aconteça.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Desperdício de atividade jurisdicional


O desperdício deve ser combatido, em qualquer atividade. Da mesma forma que é triste se ver uma fruta apodrecer no pé, sem ser colhida, é revoltante se ver um processo desenvolver-se durante muitos e muitos anos para ter um fim inglório, sendo extinto sem julgamento de mérito.

A sistemática processual civil atualmente em vigor preocupou-se com isso e impôs buscar-se dar ao jurisdicionado uma solução de mérito, evitando a proclamação de vício formal que possa ser suprido. Em parte, isso é decorrência da economia processual, mas também de algo a mais que é exatamente a busca da pacificação de um conflito.

Regra mais antiga, atualmente no art. 283, conclama a que no reconhecimento de nulidade se aproveitem os atos que não trazem prejuízo às partes. Com isso prescinde-se de começar tudo novamente para, simplesmente, se deparar com as mesmas alegações novamente, em óbvio prejuízo para a atividade jurisdicional e das partes que estão investindo no processo tempo e dinheiro.

A confluir ao mesmo resultado tem-se que passou a ser dever do magistrado “determinar o suprimento dos pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais” (art. 139, IX, CPC). A ele deixou-se de permitir simplesmente extinguir o processo, cabendo-lhe suprir, ou seja, superar ou consertar o vício, de modo a que se possa continuar o feito rumo a uma decisão que resolva o conflito. Até já se deu nome a essa imposição, tratando-a como “princípio da prevalência da decisão de mérito”, da qual decorre que “a declaração de nulidade deve constituir um meio excepcional, somente quando o vício não pode ser sanado de forma alguma” (FABIANO CARVALHO, Código de Processo Civil Anotado, AASP e GZ Editora, 1ª edição, Rio de Janeiro, 2016, pág. 214).