“Da mihi factum dabo tibi jus”. O entendimento do STF de que a Constituição de 1988 não recepcionou a Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67) não tornou prejudicadas e definitivamente superadas as postulações formuladas com base naquela lei. Se os fatos foram expostos e se subsumiam àquela norma, nada impede que seja buscada a adequação dos mesmos ao sistema (“iura novit curia”), o que pode implicar a concessão de direitos ou aplicação de restrições semelhantes àquelas que decorriam da norma vista como incompatível com a Lei Maior. Acórdão relatado pela Min. NANCY ANDRIGHI (REsp 945.461, julg. em 15/12/2009) firmou roteiro correto para o julgamento dos recursos especiais interpostos contra decisões proferidas ou que se entendia devessem ter sido proferidas com base naquela Lei. No caso em que a Lei de Imprensa foi utilizada como fundamento do acórdão recorrido e o especial discute, justamente, a interpretação e a aplicação daquela lei, há de se procurar decidir a causa aplicando o direito à espécie. Na excepcional hipótese em que isso não seja possível, anula-se o acórdão, mesmo que não haja esse pedido, devolvendo-se o processo à origem para novo julgamento, sem a aplicação da citada lei. No caso em que a referida lei foi aplicada pelo Tribunal a quo e o especial pleiteia seu afastamento, não há, em regra, necessidade de anulação. Assim, deve dar-se provimento ao recurso com o fito de privilegiar a norma constitucional em detrimento da norma não recepcionada. Já na hipótese em que o acórdão recorrido não aplicou a Lei de Imprensa e o especial busca sua incidência, também não há motivo para anulação, pois o recurso especial não deve ser conhecido, visto que invoca aplicação de lei inválida, salvo, também, excepcionalidade a ser apurada em cada processo. Na hipótese em que o acórdão adotou tanto a Lei de Imprensa quanto outra lei válida como fundamento (tal como dispositivos da Lei Civil), se o duplo fundamento refere-se ao mesmo tema e apenas a Lei de Imprensa foi abordada no recurso, mantém-se o acórdão recorrido (súmula n. 283-STF), privilegiando-se a aplicação pelo Tribunal a quo da lei válida em detrimento da discussão da lei inválida; se o duplo fundamento refere-se ao mesmo tema e só a parcela da legislação civil foi impugnada, deve-se conhecer do especial para discutir essa parcela, descartando-se, no acórdão, o fundamento inconstitucional não impugnado; mas, se o duplo fundamento refere-se a temas diversos, cumpre apreciar a questão caso a caso e só anular o acórdão se a aplicação da Lei de Imprensa, devidamente impugnada pela parte, comprometer de maneira definitiva o julgamento.